Tuesday, December 25, 2012

Aspectos do pensamento filosófico e jurídico de José Soriano de Souza


Aspectos do pensamento filosófico e jurídico de José Soriano de Souza*


                                                                                                                                 
 

José Soriano de Souza, mais significativo vulto do pensamento tomista brasileiro do século XIX, ou, como diria José Pedro Galvão de Sousa, o “pioneiro do neotomismo no Brasil”,[1] nasceu na Paraíba a 15 de setembro de 1833, e faleceu no Recife aos 12 dias do mês de agosto do ano de 1895. Havendo estudado Medicina na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro, pela qual se doutorou em 1860, e Filosofia na Universidade de Lovaina, na Bélgica, que lhe concedeu o título de doutor honoris causa, foi Cavaleiro da Ordem Pontifícia de São Gregório Magno, do Vaticano, e Professor Catedrático de Direito Público e Constitucional da Faculdade de Direito do Recife, onde também lecionou Direito Natural e Direito Romano, havendo sido ainda professor de Filosofia do Ginásio Provincial de Pernambuco, da mesma capital.

Além de exercer a clínica e o magistério, José Soriano de Souza dedicou-se ao jornalismo, colaborando no Jornal do Comércio, do Rio de Janeiro, e em diversos órgãos da imprensa recifense, havendo, inclusive, fundado e dirigido, na capital pernambucana, os jornais católicos A Esperança (1865-1867) e A União (1872-1873). Ardoroso defensor do Bispo D. Vital durante a chamada Questão Religiosa, preconizou, na década de 1870, a criação do Partido Católico, cujo esboço de programa chegou a redigir e publicar. Foi Deputado Geral do Império, pelo Partido Conservador e pela Província de Pernambuco, entre 1886 e 1889, e, após o advento da República, tomou parte na comissão que elaborou o projeto da Constituição do Estado de Pernambuco, representando aquele Estado, ainda, no Congresso Nacional Constituinte. Exerceu, enfim, de acordo com o Padre Leonel Franca, “por muitos anos, na vida política e intelectual do país a justa influência devida a seus elevados dotes intelectuais e morais”.[2]

Igualmente exerceram considerável influência na vida intelectual e política do Brasil novecentista Braz Florentino Henriques de Souza (1825-1870) e Tarquínio Bráulio de Souza Amaranto (1829-1894), irmãos de José Soriano de Souza, que, no dizer de Ubiratan de Macedo, formaram com ele a “linha de frente” do laicato católico brasileiro durante o II Reinado,[3] havendo sido, ademais, todos os três irmãos, figuras de relevo dentro do Partido Conservador.  

Braz Florentino Henriques de Souza, natural da Paraíba, foi Desembargador, Cavaleiro da Imperial Ordem de Cristo e Professor Catedrático de Direito Público e Constitucional e, depois, de Direito Civil da Faculdade de Direito do Recife, onde lecionou também Direito Criminal, Hermenêutica, Processo Civil e Processo Criminal. Foi, ainda, redator do Diário de Pernambuco, assim como um dos fundadores do Instituto Histórico e Geográfico de Pernambuco, Diretor da Instrução Pública daquela Província e Presidente da Província do Maranhão, havendo falecido no exercício deste último cargo. Traduziu os Tratados dos dois preceitos da Caridade e os Dez Mandamentos da Lei, de Santo Tomás de Aquino, e escreveu, dentre outras obras, O Casamento Civil e o Casamento Religioso (1859), O Poder Moderador (1864), O recurso à Coroa (1867) e Lições de Direito Criminal (1872).

Tarquínio Bráulio de Souza Amaranto, por seu turno, nascido no Rio Grande do Norte, foi professor de Filosofia do Ateneu de Natal e de Direito Eclesiástico da Faculdade de Direito do Recife, havendo sido ainda professor da Escola Naval, no Rio de Janeiro, recebendo o título de capitão-de-fragata honorário, e, por derradeiro, um dos lentes fundadores da Faculdade Livre de Direito, também nesta última cidade. Foi Deputado Provincial em Pernambuco, pelo Partido Conservador, no biênio 1858-1859, e Deputado Geral pela mesma agremiação política e pela Província do Rio Grande do Norte na 15ª legislatura (1872-1875), assim como na 16ª (1876-1877), na 18ª (1881-1884) e na 20ª (1886-1889), tornando-se um dos principais chefes conservadores de sua Província natal. Deixou, dentre outras obras, dois volumes de discursos por ele proferidos em defesa da Igreja na Câmara Geral do Império por ocasião da denominada Questão Religiosa.

Voltemos, porém, a José Soriano de Souza. Suas principais obras são: Ensaio Médico-Legal (1862); Compêndio de Filosofia, ordenado segundo os princípios e métodos do Doutor Angélico, S. Tomás de Aquino (1867); Lições de filosofia elementar, racional e moral (1871); Considerações sobre a Igreja e o Estado, sob o ponto de vista jurídico, filosófico e religioso (1874); Elementos de Filosofia do Direito (1880); Apontamentos de Direito Constitucional (1883); Princípios Gerais de Direito Público e Constitucional (1893).

O Compêndio de Filosofia, ordenado segundo os princípios e métodos do Doutor Angélico, S. Tomás de Aquino foi adotado nos seminários do Brasil, constituindo, ao lado das Lições de filosofia elementar, racional e moral, também do nosso autor, “o que de mais sólido e profundo se tem escrito sobre filosofia no Brasil”, segundo o entendimento do Padre Leonel Franca.[4] Referindo-se a este último livro, também elogiado pelo Papa Pio IX, em carta ao autor publicada na imprensa recifense,[5] o pensador português Manuel António Ferreira Deusdado, em artigo dado à estampa na Revue Neo-scolastique, de Lovaina, afirmou ser “difícil encontrar um outro que lhe seja superior pela precisão e o rigor com os quais deduz os princípios fundamentais da doutrina tomista”.[6] Quanto à obra Princípios Gerais de Direito Público e Constitucional, à qual Rui Barbosa não poupou elogios,[7] era ela, no dizer de Barbosa Lima Sobrinho, mesmo vinte anos depois de sua publicação, o livro mais didático para o estudo da matéria no País.[8]

Havendo vencido Tobias Barreto no concurso para a cadeira de Filosofia no Ginásio Provincial de Pernambuco, Soriano de Souza foi alvo de virulentos ataques deste filósofo, que se explicam, antes de tudo, pelo fato de haver sido Soriano, por toda a vida, um paladino da fé católica, da filosofia escolástica tomista e do direito natural tradicional ou clássico, ao passo que o autor dos Estudos alemães, que retornaria à religião católica apenas à beira da morte,[9] era um fervoroso adepto do materialismo e do denominado positivismo jurídico, ou juspositivismo, acoimando de “figuras anacrônicas” os defensores do direito natural.[10] Soriano de Souza, cuja obra, segundo José Pedro Galvão de Sousa, se impôs pela “limpeza e claridade com que escrevia”, não necessitou, de acordo com o jusfilósofo patrício, “terçar as armas da polêmica” com Tobias Barreto ou com o colega, amigo e infatigável apologista deste, Sílvio Romero, que também o atacou duramente, posto que a exposição da doutrina por ele defendida se constituía na melhor resposta aos ataques dos adversários.[11]

Depois de Santo Tomás de Aquino, os principais autores que exerceram influência sobre o pensamento filosófico de Soriano de Souza foram Santo Agostinho e os escolásticos europeus do século XIX, a exemplo de Taparelli D’Azeglio, Liberatore, Sanseverino e Kleutgen, além de filósofos que, a despeito de terem sido influenciados pelo pensamento tomista, não eram escolásticos, como Balmes, Rosmini e Ventura di Raulica. Consoante observa Miguel Reale e percebe qualquer um que estude a obra de Soriano, particularmente demonstra o filósofo paraibano “grande familiaridade com o pensamento italiano” de seu tempo.[12]

Principal representante brasileiro da corrente de ideias a que, parafraseando o Padre Leonel Franca, podemos denominar “escolástica rejuvenescida”,[13] Soriano de Souza previu, já em 1867, o profundo e sólido renascimento do pensamento tomista, que tomaria grande fôlego após a publicação, em 1879, da Encíclica Aeterni Patris, do Papa Leão XIII, atingindo o apogeu nos derradeiros anos do século XIX e, principalmente, nos albores do século XX. Com efeito, após haver afirmado que “todos os homens amantes dos sãos estudos filosóficos” lutavam para restaurar as doutrinas e o método tomista, cujo abandono fizera da “filosofia uma torre de Babel, e um campo de discussões estéreis e intermináveis”, evocando as diversas obras sobre o Doutor Angélico e o tomismo que se iam publicando em França, Itália, Alemanha e Espanha, bem como as traduções da obra do Aquinate que ora surgiam nas línguas vernáculas, e salientando a importância do trabalho que iam desempenhando no sentido da divulgação das doutrinas tomistas as revistas La Civiltà Cattolica, de Roma, e La Scienza e la Fede, de Nápoles, assim como o fato de que as escolas católicas e seminários europeus iam reabrindo suas portas ao tomismo, sustenta que “tudo enfim prenuncia a próxima restauração da grande filosofia cristã fundada por S. Tomás”.[14] A restauração de tal filosofia, de tal metafísica, edificada por Santo Tomás de Aquino “no maravilhoso acordo das duas luzes do espírito humano, a razão e a fé”, era para ele, ademais, “a máxima necessidade de nossos tempos”.[15]

Soriano de Souza partiu sempre do pressuposto de que a questão fundamental que se colocava em seu tempo era a da pugna entre aqueles que acreditavam na “ordem sobrenatural e em sua influência no destino das sociedades” e aqueles que a negavam,[16] isto é, entre o “sobrenaturalismo” e o “naturalismo”, a “fé humilde”, à qual subordinar-se-ia a razão, e a “razão independente” da modernidade, que, em seu entender, pretendia fazer caírem por terra “todas as cousas estabelecidas, assim na ordem política, como na moral e intelectual”.[17]     

Insurgindo-se contra a teoria do contrato social de Rousseau, dominante em seu tempo, Soriano de Souza, que a considerava uma “fabula impia”,[18] proclama, de acordo com a tradição tomista, que “o homem é naturalmente social, e tende a viver effectivamente em sociedade”,[19] sociedade esta que, nascida de uma reunião de famílias e tendo como elementos essenciais a “pluralidade de homens” e um “poder unitivo, que reduz à unidade aquella pluralidade”, se configura, em última análise, na “união de seres racionais que concordão em procurar um bem conhecido e querido de todos”.[20] Tal bem se configura no “bem commum”, ou “bem social” e da maior ou menor aptidão para alcança-lo resulta “a maior ou menor perfeição da sociedade”.[21]

Neste mesmo diapasão, aduz o nosso autor que o “grande princípio rector dos deveres e correlativos direitos” dessa sociedade geral, a que também podemos denominar sociedade civil ou sociedade política, é a “justiça social”,[22] termo que foi cunhado pelo filósofo e sacerdote jesuíta italiano Taparelli D’Azeglio e é definido pelo autor de Lições de filosofia elementar, racional e moral como a “inclinação habitual de cumprir os deveres correlativos aos direitos daquelles com quem vivemos em sociedade”.[23]

Sempre de acordo com os ensinamentos de Santo Tomás de Aquino, Soriano de Souza proclama que “a sociedade não é por si mesma o fim do homem”, mas sim um “meio de ele mais facilmente chegar ao bem ou a seu aperfeiçoamento”,[24] isto é, um “instrumento, mediante o qual o homem póde mais facilmente conseguir o bem, ao qual por natureza é destinado”.[25]

Prelecionando que “erro fundamental em direito publico é confundir a sociedade com o Estado”,[26] assim como “é um erro de graves consequencias na sociedade, considerar o homem em abstrato”, posto que deve este “ser estudado em suas relações reaes e concretas”,[27] aduz o autor de Princípios Geraes de Direito Público e Constitucional que o Estado, isto é, a “sociedade politicamente organizada”,[28] é, assim como a sociedade, um instrumento da pessoa humana,[29] “um meio para o homem aperfeiçoar-se, e não o fim do homem”.[30]

Voltando-se contra o liberalismo econômico, duramente condenado pelo Papa Leão XIII, na Encíclica Rerum Novarum, de 1891, Soriano de Souza sustenta que “o Estado, como instrumento político e jurídico, como poder ordenador das diversas relações da actividade humana, não póde deixar de influir, regulando juridicamente as relações econômicas”.[31] Esta intervenção, assim como a intervenção do Estado nos demais ramos da vida e da atividade humana, deve ser feita de acordo com o princípio de subsidiariedade, de sorte que, na expressão do autor, “dentro de sua esphera intervenha o Estado; mas respeite a esphera pessoal do individuo; deixe que dentro do seu dominio a pessoa individual obre livremente; só assim o cidadão se nobilita e nobilita-se o Estado”.[32]

Partindo do pressuposto de que “em sentido amplo, constituição é o complexo de leis formativas de uma sociedade, reguladoras da vida dessa sociedade”,[33] Soriano de Souza se insurge contra as constituições jurídico-políticas abstratas, produto dos princípios racionalistas do liberalismo e renegadoras das tradições históricas e costumes nacionais, afirmando que “o direito constitucional tem que consultar a experiencia, as condições peculiares e as tradições do povo a que é aplicado, sem todavia idolatrar as velhas instituições, porque isso seria desconhecer as precisões do movimento e do progresso da sociedade”. Nesta mesma toada, observa nosso autor que “os francezes por esquecerem suas condições historicas e formarem constituições theoricas”, abstratas e apriorísticas, tinham tido, entre 1791 e 1875, cerca de vinte constituições, e, em seguida, conclui que “o verdadeiro methodo no estudo do direito constitucional é aquelle que combina o elemento racional com o historico, que liga o passado ao presente, que vincula o desenvolvimento organico da vida de um povo aos principios da sua razão”.[34]

Como adepto do chamado jusnaturalismo clássico, alicerçado na tradição constituída pelos filósofos helenos, pelos jurisconsultos romanos e pelos teólogos e canonistas da cristandade medieval, Soriano de Souza proclama a existência da lei natural, da “lei moral, que deve presidir às acções dos homens individualmente considerados”, e “deve também regular-lhes as acções quando socialmente organisados constituindo o Estado”. Destarte, “um Estado, para o qual não existisse a lei moral seria uma obra de violência e de força bruta, seria a negação do direito e do bem, e não um instituto auxiliador do homem no conseguimento de seu destino social”.[35]

Combatendo o excessivo, exacerbado legalismo, ou, noutros termos, o positivismo jurídico, em nome do direito natural clássico, Soriano de Souza condena as ideias geradoras do “inumano fantasma do Estado como criador de todos os direitos”, de conformidade com as quais “não há justiça natural anterior às leis civis”. Por tais ideias se justificou, no sentir do autor de Elementos de Filosofia do Direito, a doutrina segundo a qual “todo direito é uma emanação da lei civil”, “monstruoso sistema” a que denomina ele “legalismo”, que teve em Hobbes e Bentham os mais célebres defensores e “faz depender o valor intrinseco de todos os direitos das formas exteriores da legalidade”.[36]

Ao mesmo tempo, Soriano de Souza ataca o direito natural moderno, ou racionalista, também conhecido como jusracionalismo, que, já a partir de Grócio, separou o direito de Deus e da religião, e que, com Kant, separou o direito da moral. Assim, sustenta ele que é “absurda” a separação do direito de Deus, a um tempo auctor da natureza humana e da ordem eterna da justiça”,[37] e que a moral e o direito não se separam, mas “apenas se distinguem”, devendo a “lei moral” “exercer o seu imperio tanto sobre o acto interno da liberdade, como sobre a acção externa”, de sorte que “seu poder obra sobre esses dous momentos da liberdade humana”.[38]

Soriano de Souza ensina que “promulgando uma lei deve o poder publico ter sempre em vista os principios universaes e absolutos do direito, o facto particular, e as circunstancias da sociedade”, uma vez que, “sem aquelles principios, a lei careceria de justiça”, do mesmo modo que, “sem o facto, a que se applica o principio, este nunca poderia descer à ordem pratica”. “Em summa”, arremata o autor, “todo direito positivo consta de um elemento immutavel, que são os principios universaes de justiça, e de um elemento mutavel, que são as exigências especiaes, ás quaes o legislador applica os principios de justiça”. “Longe de ser um dictame arbitrario a lei positiva é”, segundo aduz pouco adiante o jusfilósofo patrício, “a expressão autorisada do que preexiste na natureza”.[39]

Segundo Miguel Reale, o “renascimento” e o “renovar-se” da Escolástica no Brasil, com José Soriano de Souza, “adepto da ‘Néo-Escolástica”, e João Mendes Júnior, mais afeito “à tradição do pensamento português”, posto que, a despeito de invocar “os nomes dos mestres renovadores do tomismo”, se mantinha este último, “em última análise, mais ligado à ‘forma mentis’ dos escolásticos lusos da época barroca”, foi vital para que o positivismo ortodoxo não lograsse ressonância na Faculdade de Direito do Recife e naquela de São Paulo, o que nos preservou de “algumas idéias (como a das pequenas pátrias, por exemplo) que teriam sido altamente perniciosas ao nosso destino político”[40]

Tratando da democracia, cuja “indole” consiste “na influencia do povo sobre o governo”, que “póde tornar-se máxima, mas nunca traduzir-se em uma soberania”,[41] faz ver que existem dois tipos de democracia, decorrentes de duas concepções distintas de liberdade. Deste modo, “homens sem idéas, sómente dotados de sentidos e de paixões, sonhando uma ordem de cousas em que seus instinctos podessem amplamente manifestar-se, fizeram da liberdade um privilegio, um monopólio para elles”. Tal liberdade engendrou a falsa democracia, isto é, o “governo da multidão, a oclocracia, com a exclusão dos bons, e triumpho dos homens do partido dominante”.  Já do conceito de liberdade enquanto “força racional que determina a pessoa humana a desenvolver suas faculdades de conformidade com as leis do verdadeiro e do justo”, decorre aquela que seria a verdadeira democracia, “conforme à dignidade do homem, companheira da civilização e do progresso, amiga da religião, das sciencias e das artes: é o governo dos homens capazes, sem exclusões e sem privilégios”. “A verdadeira democracia”, conclui o pensador patrício, “admittindo a participação geral, directa ou indirecta, de todos no governo, inspira aos cidadãos um interesse geral pela conservação da ordem e do bem commum”.[42]

      Havendo tratado de apenas alguns aspectos do pensamento filosófico e jurídico de José Soriano de Souza, cuja riqueza é incontestável, quer concordemos ou não com suas ideias, encerramos aqui nossa singela comunicação, modesto contributo ao estudo do pensamento e da obra filosófica e jurídica deste tão injustamente olvidado pensador brasileiro.

 

*Texto da comunicação apresentada no dia 27 de novembro de 2012, no IV Simpósio de Filologia e Cultura Latino-Americana, realizado na Faculdade  de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo.



[1] SOUSA, José Pedro Galvão de. El Derecho Natural en el Mundo Lusitano del siglo XX. In PUY, Francisco (Org.). El Derecho Natural Hispanico: Actas de las “Primeras Hispánicas de Derecho Natural”. Madrid: Escelicer, 1973, p. 292.
[2] FRANCA, Padre Leonel, SJ. Noções de História da Filosofia. 15ª edição revista. Rio de Janeiro: Livraira Agir Editora, 1957, p. 272.
[3] MACEDO, Ubiratan de. Metamorfoses da liberdade. São Paulo: IBRASA; Rio de Janeiro: Fundação Nacional de Material Escolar, p. 199.
[4] FRANCA, Padre Leonel, SJ. Noções de História da Filosofia, cit., loc. cit.
[5] Cf. BARRETO, Tobias. O atraso da Filosofia entre nós (1872). In Idem. Estudos de Filosofia. 2ª ed. São Paulo: Grijalbo; Brasília: INL, 1977, pp. 159-179. A referência à carta de Pio IX a Soriano de Souza se encontra à página 161.
[6] DEUSDADO, Manuel António. La philosophie thomiste en Portugal: Notes pour servir à l’histoire de la philosophie en Portugal. In Revue Neo-scolastique, vol. 5, n. 20, Louvain, 1898, pp. 429-450. O trecho aqui citado se encontra às páginas 440-441.
[7] MACEDO, Ubiratan de. Metamorfoses da liberdade, cit., loc. cit.
[8] LIMA SOBRINHO, Alexandre José Barbosa. Introdução. In SOUZA, Braz Florentino Henriques de. Do Poder Moderador: ensaio de Direito Constitucional contendo a análise do título V, capítulo I, da Constituição Política do Brasil. 2ª ed. Brasília: Senado Federal, Editora da Universidade de Brasília, 1978, p. 3.
[9] FRANCA, Padre Leonel, SJ. Noções de História da Filosofia, p. 299.
[10] BARRETO, Tobias. Questões vigentes, p. 132.
[11] SOUSA, José Pedro Galvão de. El Derecho Natural en el Mundo Lusitano del siglo XX, cit., p. 292.
[12] REALE, Miguel. La cultura giuridica italiana in Brasile. In Revista internazionale di filosofia del diritto. Anno XXXV, fasc. 6, nov/dicembre 1958.
[13] FRANCA, Padre Leonel, SJ. Noções de História da Filosofia, cit., p. 208.
[14] SOUZA, José Soriano de. Compendio de Philosofia ordenado segundo os principios e methodo do Doutor Angelico, S. Tomás de Aquino. Recife: Typ. da Esperança, 1867, pp. XXXVI-XXXVII.
[15] Idem. Lições de philosofia elementar, racional e moral. Recife: Livraria Academica, 1871,  p. X.
[16] Idem, p. II.
[17] Idem, p. XXXVII.
[18] Idem.  Compendio de Philosophia ordenado segundo os principios e methodo do Doutor Angelico, S. Thomaz d’Aquino, cit., p. 649.
[19] Idem. Principios Geraes de Direito Publico e Constitucional. Recife: Casa Editora Empreza d'A Provincia, 1893, p. 49.
[20]Idem. Lições de philosofia elementar, racional e moral. Recife: Livraria Academica, 1871, p. 507. Grifos em itálico no original.
[21] Idem, loc. cit. Grifos em itálico no original.
[22] Idem, p. 508. Grifos em itálico no original.
[23] Idem, p. 509. Grifos em itálico no original.
[24] Idem, p. 507. Grifos em itálico no original.
[25] Idem. Principios Gerais de Direito Publico e Constitucional, cit., p. 51.
[26] Idem, p. 63.
[27] Idem, p. 64.
[28] Idem, p. 65. Grifos em itálico no original.
[29] Idem, p. 63.
[30] Idem, p. 69.
[31] Idem, p. 67.
[32] Idem, p. 56.
[33] Idem, p. 15. Grifos em itálico no original.
[34] Idem, p. 20. Grifos em itálico no original.
[35] Idem, p. 67.
[36] Idem. Elementos de Philosofia do Direito. Recife: Typographia Central, 1880, p. 59.
[37] Idem, p. XVI.
[38] Idem, pp. 21-22.
[39] Idem, pp. 27-28.
[40] REALE, Miguel. Momentos decisivos e olvidados do pensamento brasileiro. Porto Alegre: Universidade do Rio Grande do Sul, Instituto de Filosofia, s/d, pp. 42-43.
[41] Idem, p. 392.
[42] Idem, pp. 391-392.

Monday, December 10, 2012

O Integralismo, escola de nobreza espiritual


O Integralismo, escola de nobreza espiritual*

 

Nós outros, Integralistas, proclamamos que o Homem tem o seu valor medido por seus feitos e suas virtudes e não pelo poder ou os bens materiais que possui, uma vez que temos plena consciência de que tal poder e tais bens não são, ao contrário dos bens do Espírito, bons em si e por si próprios, sendo legítimos apenas quando e enquanto ordenados ao Bem Comum. Noutros termos, entendemos que a Pessoa Humana não vale por aquilo que tem, mas sim por aquilo que é e por aquilo que realiza em prol do Bem Geral, e a propriedade das riquezas terrenas está condicionada ao cumprimento dos deveres que tem o proprietário para com a Sociedade, do mesmo modo que só é lídimo o poder que promove o engrandecimento do Bem Social.

Assim, fazemos nossas as palavras de Plínio Salgado, quando este proclama, numa das imorredouras páginas do Manifesto de Outubro, que “o homem vale pelo trabalho, pelo sacrifício em favor da Família, da Pátria e da Sociedade”, assim como “pelo estudo, pela inteligência, pela honestidade, pelo progresso nas ciências, nas artes, na capacidade técnica, tendo por fim o bem-estar da Nação e o elevamento moral das pessoas”, não sendo a riqueza senão “bem passageiro, que não engrandece ninguém, desde que não sejam cumpridos pelos seus detentores os deveres que rigorosamente impõe, para com a Sociedade e a Pátria” [1].  E fazemos nossas, do mesmo modo, as palavras daquele ilustre pensador patrício quando este preleciona, no Código de Ética do Estudante, que é necessário se lembrar “sempre de que a verdadeira grandeza está na virtude e não no êxito dos negócios ou da carreira, porque os bens do mundo são inconstantes” e podemos perdê-los, enquanto os bens acumulados em nós mesmos à custa de nos aperfeiçoarmos “no saber e na dignidade” não poderão ser destruídos por força alguma, assim como quando ensina ele que não devemos nos impressionar “com a riqueza dos ricos e o brilho dos que esplendem em altos postos”, mas sim “com a sabedoria dos sábios, o heroísmo dos heróis e a santidade dos santos” [2].

Sustentamos, destarte, os soldados do Sigma, arautos e paladinos de Deus, da Pátria e da Família, que o Ente Humano deve buscar a santidade, isto é, lutar com todas as suas forças para permanecer sempre no caminho dos justos, pelejar para ser perfeito como o Pai Celeste, aprimorando-se no zelo das virtudes, destruindo o burguês que há dentro de si e tornando-se um exemplo de Nobreza do Espírito, de Aristocracia da Virtude. Isto porque sabemos que a crise de nossos dias é, antes e acima de tudo, uma crise do Homem, de sorte que, antes de empreendermos a restauração da Sociedade Orgânica, da Sociedade Tradicional, é necessário empreender a restauração do Homem Tradicional, ou, simplesmente, como propõe Plínio Salgado, a “reconstrução do Homem” [3].

Ao falarmos que devemos destruir o burguês que há dentro de cada um de nós compreendemos a burguesia não como uma classe, mas, consoante leciona o autor de Espírito da burguesia, como “um estado de espírito”, que não é senão “o próprio espírito da avareza e da sensualidade”, hoje presente em todas as classes, e que se traduz, antes de tudo, pela “preocupação exclusiva pelos bens materiais”, que deixam de se constituir em um meio da Pessoa Humana, ordenado a seu Fim Último, que é Deus, e se transformam em um fim, o mesmo ocorrendo com os cinco sentidos do Homem, tornados fins únicos de todas as suas manifestações e realizações [4]. É, pois, o espírito daqueles que, segundo Cícero, têm apego ao dinheiro, às casas magníficas, aos bens materiais, ao poder e aos prazeres “como sendo coisas boas ou desejáveis em si mesmas” e que, “embora repletos dessas coisas”, “desejam acima de tudo aquilo que já têm em abundância”, posto que neles a “sede da cobiça nunca é extinta ou saciada” [5].   

Enquanto o espírito burguês é, na frase do autor de Mensagem às pedras do deserto, “o conformismo, o comodismo, o interesse vulgar, o prazer mesquinho, a incapacidade de ideal, a demissão dos deveres, a submissão ao cotidiano, o fatalismo inerme, a indiferença criminosa, o abandono à rotina, o egoísmo cego, a ostentação ridícula, a descrença e a incapacidade de ação” [6], o espírito nobre, a que também podemos denominar espírito aristocrático e espírito de elite, no sentido autêntico, espiritual e não econômico, deste último vocábulo, e que, como sublinhamos algures, se caracteriza, antes e acima de tudo, pela busca das virtudes espirituais e cívicas, pela existência voltada sobretudo à acumulação de bens extraterrenos, pela rejeição da vida cômoda e o combate sem trégua em prol dos valores perenes da Tradição, que implica, na hora que passa, em nadar sempre contra a maré de erros da inautêntica civilização materialista a que denominamos Modernidade, ou Mundo Moderno [7].

A reconstrução do Homem dar-se-á por meio da Revolução Interior, ou Revolução Espiritual, que implica, como faz salientar Plínio Salgado, na autoimposição de “normas de nobreza tanto na vida particular como na vida pública” [8] de cada um de nós e que, na frase de Gustavo Barroso, se configura numa “mudança de atitude do espírito em face dos problemas que se lhe apresentam, em qualquer ordem moral ou material”, alterando a totalidade dos conceitos e dando “um novo sentido de vida” e se processando “com ideias e homens cheios dessas ideias, não correndo o perigo de ver à sua frente, no dia da vitória, um deserto de homens e de ideias” [8]. Foi esta Revolução Interior que teve em mente Corneliu Codreanu, líder máximo da Legião de São Miguel Arcanjo, ao proclamar que “o homem novo e a nação renovada pressupõem uma grande revolução espiritual de todo o povo, isto é, uma mudança da orientação espiritual moderna, e uma ofensiva categórica contra essa orientação” [9].

O Integralismo é, enfim, uma escola de nobreza espiritual, que visa preparar o Homem para reconstruir a si mesmo e à Sociedade autêntica, formando uma lídima Aristocracia do Espírito, disposta a tudo sacrificar em prol de Deus, da Pátria e da Família sem nada pedir em troca, nem mesmo a compreensão dos seus patrícios.

 

Victor Emanuel Vilela Barbuy, Presidente Nacional da Frente Integralista Brasileira.

São Paulo, 07 de dezembro de 2012-LXXX.
 
 
*Texto originalmente publicado no boletim "Ação!", da Frente Integralista Brasileira.