Showing posts with label Economia. Show all posts
Showing posts with label Economia. Show all posts

Monday, February 16, 2015

O ESTADO INTEGRAL E A ECONOMIA


O Integralismo, movimento cívico-político-cultural de renovação moral e social, propugna a implantação, no Brasil, do Estado Integral, isto é, do “Estado Corporativo Cristão, antitotalitário, antiliberal, anticomunista” [1], inspirado no Cristianismo, no Tomismo e nas realidades nacionais brasileiras e tendo por alicerces a dignidade da Pessoa Humana e os Grupos Sociais Naturais e por lema a tríade “Deus, Pátria e Família” [2]. Denominado “Estado Orgânico Integral Cristão” por Alcibíades Delamare [3], é o Estado Integral o Estado que, nas palavras de Plínio Salgado, “vem de Cristo, inspira-se em Cristo, age por Cristo e vai para Cristo” [4], obedecendo aos preceitos de Sua Lei, chamada Lei Divina por Santo Tomás de Aquino [5], assim como aos preceitos da Lei Natural, também denominada Lei Moral [6].
            O Estado Integral é o Estado Ético, antitotalitário e anti-individualista, que não se constitui em um princípio nem em um fim, mas sim em um meio, um instrumento a serviço do Ente Humano e do Bem Comum [7], sendo mister assinalar que o Homem, na tríplice esfera de suas aspirações materiais, intelectuais e morais, possui direitos naturais, que não decorrem do Estado, mas sim de sua própria essência e que não podem ser violados pelo Estado, cujo poder limitam [8].
            Isto posto, cumpre sublinhar que o Estado Ético Integral, ou, simplesmente, Estado Integral, é um Estado a um só tempo de Direito e de Justiça e é ético não por ser a própria encarnação da Ética, como querem, dentre outros, Hegel [9] e Gentile [10], mas sim por ser inspirado na Ética, que lhe é anterior e superior, e movido por um ideal ético [11], do mesmo modo que é de Direito e de Justiça não por ser o criador ou a encarnação do Direito e da Justiça, que igualmente lhe são precedentes e superiores, mas sim por se pautar nas regras do Direito e da Justiça e se mover por um ideal de Direito e de Justiça.
            Em matéria de Economia, o Estado Integral, inspirado nas lições do Evangelho, do pensamento tomista e da Doutrina Social da Igreja, defende o distributismo [12] e, fundado, como escreveu Gustavo Barroso, “na fórmula de Santo Tomás – de que o homem não foi feito para a economia, mas a economia foi feita para o homem” [13], pretende construir uma ordem social essencialmente cristã, repelindo, pois, “no campo econômico, a usura, a especulação e a escravização do homem pelo homem” [14]. Estado forte, sobretudo moralmente, e alicerçado na dignidade da Pessoa Humana e nos Grupos Naturais, o Estado Integral reconhecerá e fomentará, de acordo com o princípio da subsidiariedade, a propriedade privada e a iniciativa particular, dentro de seus justos limites, uma vez que o direito natural de propriedade não pode e não deve ser exercido de modo injusto, em detrimento do Bem Comum. Noutras palavras, ao direito de propriedade correspondem deveres, que o Estado Integral regulará, visando a Justiça Social [15].
            Isto posto, faz-se mister enfatizar que no século XIII, nas páginas de sua Suma Teológica, já proclamava Santo Tomás de Aquino que “qualquer bem da parte se ordena ao bem do todo” [16], de modo que os bens particulares devem atender tanto às necessidades de seu proprietário quanto àquelas do Bem Comum, não devendo o ente humano ter os bens terrenos como próprios, mas sim como comuns, de modo que os comunique facilmente aos outros, quando deles tiverem necessidade [17]. Tem a propriedade, pois, segundo a preleção do Aquinate, que fazemos nossa, um duplo caráter individual e social, que foi assinalado, dentre outros, por Leão XIII, na Encíclica Rerum Novarum [18], Pio XI, na Encíclica Quadragesimo Anno [19], e João XXIII, na Encíclica Mater et Magistra [20], e que, como bem assinalou Plínio Salgado, “não destrói, antes fortifica o direito de propriedade” [21].
            O Estado Integral defenderá, pois, o direito de propriedade, cuja difusão promoverá, da mesma forma que combaterá os dois grandes inimigos deste direito natural da Pessoa Humana, a saber, o capitalismo e o comunismo. Estes dois sistemas econômicos, além de atentarem contra o direito de propriedade, o último abertamente e o primeiro sub-repiticiamente, sobretudo por meio da ação dos trustes, cartéis, monopólios e oligopólios, são essencialmente materialistas, colocando os bens terrenos acima do Homem e vendo a riqueza material como um fim em si e não como um meio, um instrumento do Ente Humano, trocando, assim, a busca do Sumo Bem, que é Deus, por aquela da “suma riqueza”, como bem observou Heraldo Barbuy [22], ou, noutras palavras, trocando Cristo Rei e Redentor por Mamon e pelo Bezerro de Ouro.
            Havendo feito referência ao sistema capitalista e assinalado que é este um inimigo do direito de propriedade, reputamos oportuno sublinhar que por capitalismo compreendemos o sistema econômico em que o sujeito da Economia é o Capital, cujo acréscimo ilimitado, pela aplicação de pretensas leis econômicas mecânicas, é considerado o objetivo final e único de toda a produção. Neste sentido, podemos citar, dentre outros, Miguel Reale, que, na obra O capitalismo internacional, de 1935, definiu o capitalismo como “o sistema econômico no qual o sujeito da Economia é o Capital, sendo o acréscimo indefinido deste considerado o objetivo final e único de toda a produção” [23], e o Padre Julio Meinvielle, que, no livro intitulado Concepción católica de la Economía e publicado em 1936, aduziu que o  capitalismo se constitui em “um sistema econômico que busca o acréscimo ilimitado dos lucros pela aplicação de leis econômicas mecânicas” [24]. Do mesmo modo, julgamos ser mister frisar que a ação do capitalismo sobre a propriedade foi bem resumida por Gustavo Barroso, em O que o integralista deve saber:
Capitalismo não é a propriedade. Capitalismo é o regime em que o uso da propriedade se tornou abuso, porque cada indivíduo pode, se tiver dinheiro, especular no sentido de fraudar e oprimir os outros. Capitalismo é o regime em que o uso da propriedade se tornou desordenado, porque cada indivíduo pode agir à vontade e produzir sem se preocupar com as necessidades da coletividade, causando o desemprego, as falências, os salários ínfimos e a carestia da vida. Capitalismo é o regime em que um indivíduo ou um grupo de indivíduos pode açambarcar as propriedades por meio de trustes, cartéis ou monopólios. O Capitalismo, portanto, em última análise é um destruidor da propriedade [25].
            No mesmo sentido das palavras de Gustavo Barroso, ponderou Hilaire Belloc que o capitalismo não é o sistema da propriedade, mas sim o sistema que “emprega esse direito em benefício de uns poucos privilegiados contra um número muito maior de homens que, ainda que livres e cidadãos em [suposta] igualdade de condições, carecem de toda base econômica própria” [26], isto é, o sistema econômico no qual os meios de produção são controlados por uma minoria e a esmagadora maioria dos cidadãos se encontra excluída e despossuída [27]. Ainda neste diapasão, aduziu Gilbert Keith Chesterton que se poderia pensar que os grandes capitalistas são defensores da propriedade, mas, em verdade, são eles inimigos da propriedade, pois são inimigos de seus limites. “O duque de Sutherland possuir todas as chácaras numa única propriedade rural é”, segundo o escritor e pensador inglês, “a negação da propriedade, assim como seria a negação do casamento se ele tivesse todas as nossas esposas num único harém” [28].
            O Estado Integral promoverá, sob a égide da inteligência, a harmonia do Capital e do Trabalho [29], impondo a disciplina necessária a ambos, dentro de rigorosas normas de Justiça Social, de sorte que nenhuma classe possa excluir a outra dos resultados e benefícios da produção da riqueza nacional [30], cumprindo sublinhar que o Capital é, assim como a propriedade, trabalho acumulado [31]. No Estado Integral, o Trabalho, entendido como direito individual e dever social [32], não será tratado como uma mercadoria sujeita à chamada lei da oferta e da procura [33], como tem sido sob o nefando jugo do sistema capitalista.
            Do mesmo modo, no Estado Integral, deixará a moeda de ser outra mercadoria, assumindo integralmente seu papel de intermediária entre as trocas, instrumento de cálculo e padrão de medida, sepultando-se, desta forma, a funesta especulação financeira, conforme acentuou Sérgio de Vasconcellos, no pequeno grande artigo intitulado A Economia Integralista e enfeixado em sua obra Integralismo: um novo paradigma [34].
            Como bem observou Sérgio de Vasconcellos, no referido estudo, síntese admirável das doutrinas econômicas do Integralismo, o Estado Integral intervirá na Economia, mas cumpre salientar que sua intervenção será diversa daquela que se dá no sistema capitalista, no qual a interferência do Estado ocorre, em regra, para beneficiar indivíduos e grupos de indivíduos, em detrimento do Bem Social. A intervenção do Estado Integral, por seu turno, ocorrerá apenas quando for necessária e será sempre exercida em prol do Bem Comum [35], de acordo com o princípio da subsidiariedade.
            Já nos havendo estendido além do que inicialmente pretendíamos, encerramos aqui este singelo trabalho sobre o Estado Integral e a Economia, salientando que o Estado Ético Orgânico Integral Cristão, que é, como há pouco afirmamos, um Estado de Direito e de Justiça, reconduzirá a Economia à condição de instrumento do Homem e organizará a Nação numa autêntica Democracia Orgânica, moralizando-a, recristianizando-a integralmente e dando-lhe Harmonia e Justiça Social.

            Por Cristo e pela Nação!
            Victor Emanuel Vilela Barbuy, Presidente Nacional da Frente Integralista Brasileira, São Paulo, 13 de fevereiro de 2015- LXXXII.   


NOTAS:

[1] Cf. Gustavo BARROSO, Comunismo, Cristianismo, Corporativismo, Rio de Janeiro, Editora ABC Limitada, 1938, pp. 97-98.
[2] Idem, pp. 98 e 100.
[3] Aos moços universitários, in Enciclopédia do Integralismo, volume II, Rio de Janeiro, GRD/Livraria Clássica Brasileira, s/d, pp. 72-73.
[4] Cristo e o Estado Integral, in O Integralismo perante a Nação, 5ª edição, in Obras Completas, volume 9, 2ª edição, São Paulo, Editora das Américas, 1957, p. 201. Cristo e o Estado Integral é a peroração do discurso proferido por Plínio Salgado na Sessão Soleníssima das Cortes do Sigma, realizada a 12 de junho de 1937 no Instituto Nacional de Música, no Rio de Janeiro.
[5] Suma Teológica, 1ª parte da 2ª parte, Questão 91, Artigos IV e V, Tradução de Alexandre Corrêa, Organização de Rovílio Costa e Luís Alberto de Boni, Porto Alegre, Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindes, Livraria Sulina Editora; Caxias do Sul, Universidade de Caxias do Sul, 1980, pp. 1740-1743.
[6] Cf. Francisco Galvão de CASTRO, Os quatro pontos do Integralismo, in Enciclopédia do Integralismo, Suplemento, Rio de Janeiro, Livraria Clássica Brasileira, 1960, p. 23.
[7] Cf. Plínio SALGADO, Estado Totalitário e Estado Integral, in Madrugada do Espírito, 4ª edição, in Obras Completas. 2ª ed., volume 7, São Paulo, Editora das Américas, 1957, p. 443 (artigo publicado originalmente no jornal A Ofensiva, do Rio de Janeiro, a 01 de novembro de 1936); Goffredo TELLES JUNIOR, Justiça e Júri no Estado Moderno, São Paulo, Empresa Gráfica da Revista dos Tribunais, 1938, p. 31. Dentre os demais autores que afirmam que o Estado é meio e não fim, podemos citar: Marcus Claudio ACQUAVIVA,Teoria Geral do Estado, 2ª ed., revista e aumentada, São Paulo, Editora Saraiva, 2000; Tristão de ATHAYDE (Alceu Amoroso Lima), Política, Rio de Janeiro, Livraria Católica, 1932, p. 77; Darcy AZAMBUJA, Teoria Geral do Estado, 38ª edição, São Paulo, Globo, 1998, p. 122; Heraldo BARBUY, Sumo bem e suma riqueza, Separata do Anuário da Faculdade de Filosofia “Sedes Sapientiae”, da Universidade Católica de São Paulo, 1953; Idem, A Família e a Sociedade, in Servir, n° 1297, ano XXVII, São Paulo, 20 de setembro de 1957, p. 77; Victor Emanuel Vilela BARBUY, Justiça e Bem Comum, in Marcelo Roland ZOVICO (Organizador), Filosofia do Direito: Estudos em homenagem a Willis Santiago Guerra Filho, São Paulo, Editora Clássica, 2012, p. 322; José Carlos de Ataliba NOGUEIRA, O Estado é um meio e não um fim, 1ª edição, São Paulo, Revista dos Tribunais, 1940, p. 113; Arthur Machado PAUPÉRIO, Teoria Geral do Estado, 7ª edição, Rio de Janeiro, Forense, 1979; José Pedro Galvão de SOUSA, Iniciação à Teoria do Estado, São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 1976, pp.12-13; José Soriano de SOUZA, Principios Geraes de Direito Publico e Constitucional, Recife, Casa Editora Empreza d'A Provincia, 1893, p. 63.
[8] Cf. Plínio SALGADO, Carta de Princípios do Partido de Representação Popular, Edição do Comitê de Propaganda pró Candidatura de Plínio Salgado, 1955, p. 3. A Carta de Princípios do Partido de Representação Popular foi escrita em meados do ano de 1946 e aprovada pela 2ª Convenção Nacional daquele partido, na sessão de 20 de agosto daquele ano.
[9] Princípios da Filosofia do Direito, Tradução de Norberto de Paula Lima, Adaptação e notas de Márcio Pugliesi, São Paulo, Ícone, 1997, §§ 257-258, pp. 204-205.
[10] Idee fondamentali, in Enciclopedia Italiana di Scienze, Lettere ed Arti, volume XIV, Milão, Treves-Treccani-Tumminelli, 1932-X, pp. 847-848.
[11] Cf. Gino. ARIAS, Corso di Economia Politica Corporativa, 2ª edição aumentada e atualizada, Roma, Società Editrice Del “Foro Italiano”, 1937-XV, p. XVIII; Idem, Manual de Economía Política, Buenos Aires, L. Lajouane & Cia. – Editores, 1942, p. 410; Victor Emanuel Vilela BARBUY, Justiça e Bem Comum, in Marcelo Roland ZOVICO (Organizador), Filosofia do Direito: Estudos em homenagem a Willis Santiago Guerra Filho, São Paulo, Editora Clássica, 2012, p. 333; Giorgio DEL VECCHIO, Teoria do Estado, Tradução portuguesa de António Pinto de Carvalho, Prefácio de Miguel Reale, São Paulo, Edição Saraiva, 1957, p. 210; Miguel REALE, O Estado Moderno: liberalismo, fascismo, integralismo, 2ª edição, Rio de Janeiro, José Olympio Editora, 1934, p. 197.
[12] Cf. Francisco Galvão de CASTRO, Os quatro pontos do Integralismo, in Enciclopédia do Integralismo, Suplemento, Rio de Janeiro, Livraria Clássica Brasileira, 1960, p. 8.
[13] Comunismo, Cristianismo, Corporativismo, Rio de Janeiro, Editora ABC Limitada, 1938, p. 99.
[14] Idem, p. 101.
[15] Cf. Gustavo BARROSO, Carta Brasileira do Trabalho, in Integralismo e Catolicismo, Rio de Janeiro, Editora ABC Limitada, 1937, p. 282.
[16] Suma Teológica, 2ª parte da 2ª parte, Questão 58, Artigo 5º, Solução, Tradução de Alexandre Corrêa, 1ª edição, volume XIV, São Paulo, Livraria Editora Odeon, 1937, p. 28.
 [17] , 2ª parte da 2ª parte, Questão 66, Artigo 2º, Solução, Tradução de Alexandre Corrêa, 1ª edição, volume XIV, São Paulo, Livraria Editora Odeon , 1937, p. 162.
[18] Encíclica Rerum Novarum, dada em Roma a 15 de maio de 1891. Disponível em: http://www.vatican.va/holy_father/leo_xiii/encyclicals/documents/hf_l-xiii_enc_15051891_rerum-novarum_po.html. Acesso em 13 de fevereiro de 2015.
[19] Encíclica Quadragesimo Anno, dada em Roma a 15 de maio de 1931. Disponível em:
[20] Encíclica Mater et Magistra, dada em Roma a 15 de maio de 1961. Disponível em:
[21] Direitos e deveres do Homem, 4ª edição, in Obras Completas, 2ª edição, volume 5, São Paulo, Editora das Américas, 1957, p. 259.
[22] Sumo bem e suma riqueza, Separata do Anuário da Faculdade de Filosofia “Sedes Sapientiae”, da Universidade Católica de São Paulo, 1953, p. 146.
[23] O capitalismo internacional: introdução à Economia Nova. 1ª ed. Rio de Janeiro: José Olympio Editora, 1935, p. 87.
[24] Concepción Católica de la Economía p. 5. Disponível em:
[25] Gustavo BARROSO, O que o Integralista deve saber, 5ª edição, Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, S.A, 1937, p. 135. Grifos em itálico no original.
[26]  La crisis de nuestra civilización, Tradução castelhana de Carlos María Reyles, Buenos Aires: Editorial Sudamericana, 1979.p. 154. Tradução nossa.
[27] An Essay on the Restoration of Property. Norfolk: HIS Press, 2002, p. 28.
[28] O que há de errado com o mundo, Tradução de Luíza Monteiro de Castro Silva Dutra, Campinas, SP, Ecclesiae, 2013, pp. 55-56.
[29] Cf. Gustavo BARROSO, Comunismo, Cristianismo, Corporativismo, Rio de Janeiro, Editora ABC Limitada, 1938, p. 100; Idem, Carta Brasileira do Trabalho, in Integralismo e Catolicismo, Rio de Janeiro, Editora ABC Limitada, 1937, p. 282.
[30] Idem, Carta Brasileira do Trabalho, in Integralismo e Catolicismo, Rio de Janeiro, Editora ABC Limitada, 1937, p. 283.
[31] Idem, p. 282.
[32] Idem, p. 283; Plínio SALGADO, Direitos e deveres do Homem, 4ª edição, in Obras Completas, 2ª edição, volume 5, São Paulo, Editora das Américas, 1957, p. 272.
[33] Cf. Gustavo BARROSO, Carta Brasileira do Trabalho, in Integralismo e Catolicismo, Rio de Janeiro, Editora ABC Limitada, 1937, p. 283; Plínio SALGADO, Direitos e deveres do Homem, 4ª edição, in Obras Completas, 2ª edição, volume 5, São Paulo, Editora das Américas, 1957, p. 267; Sérgio de VASCONCELLOS, Integralismo: um novo paradigma, São Paulo, Agbooks, 2014, p. 138.
[34] Integralismo: um novo paradigma, São Paulo, Agbooks, 2014, p. 138.
[35] Idem, loc. cit.

Friday, March 11, 2011

Apresentação do blogue Economia Católica


Por Victor Emanuel Vilela Barbuy




Seriamente preocupados com o avanço das nefandas ideias do liberalismo econômico nos círculos católicos brasileiros, inclusive em determinados grupos que se proclamam “tradicionalistas” ou “ultramontanos”, parecendo desconhecer que o Tradicionalismo e o Ultramontanismo são totalmente avessos a todos os matizes de liberalismo, resolvemos criar o presente blogue para difundir a verdadeira Economia Católica, Economia esta de cunho Tradicional, Histórico, Social, Moral, Ético e Orgânico, em nítida contraposição à Economia antitradicional, anti-histórica, individualista, amoral, aética e inorgânica do liberalismo, ideologia espúria corajosa, vigorosa e rigorosamente combatida, em todas as suas facetas, pelo Magistério da Santa Igreja.
Inspirados pelos ensinamentos da autêntica Doutrina Social da Igreja e dos principais vultos do pensamento católico tradicional, sustentaremos, no presente blogue, a Economia Perene do Catolicismo, transcendida pela Ética e movida por um ideal ético e compreendida como serva e não como senhora do Homem.
Temos plena consciência de que o Estado, consoante preleciona Pio XII, é, ao lado da Família, a principal coluna de sustentação da Sociedade Humana [1], assim como temos integral consciência de que o Princípio de Subsidiariedade, ao contrário do que defendem os nossos católicos adeptos do liberalismo, não proíbe o Estado de interferir na Ordem Econômica, mas, ao contrário, afirma que o Estado tem o dever de auxiliar e complementar as atividades dos indivíduos e dos Grupos Sociais Naturais, não apenas no plano econômico, mas em todos os setores da vida humana. Temos igualmente total consciência de que o domínio da Pessoa Humana sobre os bens exteriores, que esta recebeu de Deus, deve estar sempre submetido a um fim, que impõe a necessidade racional e social do bom uso de tais bens, que, consoante preleciona Santo Tomás de Aquino, não devem ser tidos como próprios, mas sim comuns, de sorte que facilmente o proprietário dê parte deles aos outros, quando estes necessitarem [2]. Temos, por fim, absoluta consciência de que a atual ordem econômica, nascida do liberalismo, é a antítese da Ordem Econômica Católica e Tradicional, que os principais arautos do liberalismo e do neoliberalismo nunca deixaram de atacar.
Adam Smith, que é o mestre por excelência do liberalismo econômico, assim como Rousseau é o mestre por excelência do liberalismo político, condenou os Grupos Sociais Naturais, particularmente as corporações, base da Economia Social Católica, como fica patente em sua obra A riqueza das nações. Mais do que isso, foi ele o responsável pela funesta separação entre a Economia e a Ética, uma vez que mesmo os fisiocratas franceses, seus precursores, reconheciam, ainda que de forma inadequada e confusa, uma certa dependência, ainda que bem remota, da Economia em face da Ética. Aliás, respondendo àqueles que sustentam que Adam Smith não separou a Economia da Ética, ressaltando que ele foi um doutrinador moral, autor de obra intitulada Teoria dos sentimentos morais, afirmamos, com o grande economista tomista italiano Gino Arias, que a doutrina moral sustentada pelo autor de A riqueza das nações é uma doutrina moral de fundo inegavelmente utilitário e individualista [3], nada tendo que ver com a Doutrina Moral Tradicional.
Outro mestre de nossos liberais, o ateu Hayek, principal expoente da denominada Escola de Viena ao lado de Von Mises, condenou abertamente a ideia de Justiça Social, elemento central da Doutrina Social da Igreja, no segundo volume de sua trilogia Direito, legislação e liberdade, intitulado A miragem da justiça social.
E Von Mises, quiçá o maior ídolo desses equivocados indivíduos que, contrariando o Evangelho, tentam adorar, a um só tempo, a Deus e a Mamon, Von Mises, que pertencia à nefanda religião daqueles cujo deus é o dinheiro, atacou virulentamente a Doutrina Social da Igreja, a que denomina, equivocadamente, “socialismo cristão”. E atacou a própria Igreja, Corpo Místico de Cristo, sustentando que “a obra civilizadora que a Igreja realizou ao curso dos séculos é obra da Igreja e não do cristianismo”, chegando ao absurdo de afirmar que a Doutrina Cristã é somente compatível com o capitalismo e a Economia de consumo e a defender a tese de que a partir do Syllabus, a Religião da Caridade teria se transformado, por seu combate ao liberalismo, em “religião do ódio do mundo, quando pareceu que este se aproximava da felicidade” [4].
Ante o exposto, exsurge a verdade, límpida, clara, cristalina e insofismável: Ninguém pode ser a um só tempo adepto do liberalismo econômico e da Doutrina Social da Igreja.
Esperando que este blogue agrade a todos os verdadeiros adeptos da Doutrina Social da Igreja e que sirva para afastar o maior número possível de católicos das fileiras do liberalismo econômico, se constituindo em uma atalaia do mais lídimo Tradicionalismo e da mais autêntica Doutrina Social da Igreja, encerramos por aqui a presente apresentação, não sem antes citarmos as magníficas palavras de Pio XII na Exortação Apostólica Mentis Nostrae, quando o Romano Pontífice, havendo sustentado que é dever do clero denunciar sem trégua a iniquidade do comunismo, se refere àqueles que se mostram tímidos na condenação dos efeitos ruinosos da ordem engendrada pelo capitalismo:
“Outros, porém, se mostram tímidos e incertos quanto ao sistema econômico conhecido pelo nome de capitalismo, do qual a Igreja não tem cessado de denunciar as graves consequências. A Igreja, de fato, apontou não somente os abusos do capital e do próprio direito de propriedade que o mesmo sistema promove e defende, mas tem igualmente ensinado que o capital e a propriedade devem ser instrumentos da produção em proveito de toda a sociedade e meios de manutenção e de defesa da liberdade e da dignidade da pessoa humana. Os erros dos dois sistemas econômicos [comunismo e capitalismo] e as ruinosas consequências que deles derivam devem a todos convencer, e especialmente aos sacerdotes, a manter-se fiéis à doutrina social da Igreja e a difundir-lhe o conhecimento e a aplicação prática. Essa doutrina é, realmente, a única que pode remediar os males denunciados e tão dolorosamente difundidos: ela une e aperfeiçoa as exigências da justiça e os deveres da caridade, promove tal ordem social que não oprima os cidadãos e não os isole num egoísmo seco, mas a todos una na harmonia das relações e nos vínculos da solidariedade fraternal” [5].


[1] PIO XII. La Elevatezza, discurso aos novos cardeais sobre a supranacionalidade da Igreja (20 de fevereiro de 1946). Disponível em: http://www.vatican.va/holy_father/pius_xii/speeches/1946/documents/hf_p-xii_spe_19460220_la-elevatezza_it.html. Acesso em 02/06/2010.
[2] AQUINAS, Sanctus Thomas. Summa Theologica. IIa, IIae, q.66, art. 2º.
[3] ARIAS, Gino. Manual de Economía Política. Buenos Aires: L. Lajouane & Cia. – Editores, 1942, pp. 58-60.
[4] MISES, Ludwig von. Le socialisme: Étude economique et sociologique. Trad. francesa de Paul Bastier, André Terrasse e François Terrasse. Paris: Éditions M.-Th. Génin, Librairie de Médicis, 1938, pp. 486 e 489.
[5] PIO XII. Mentis Nostrae. In Idem. Documentos de Pio XII. Trad. Poliglota Vaticana. São Paulo: Paulus, 1998, p. 499. Também disponível em: http://www.vatican.va/holy_father/pius_xii/apost_exhortations/documents/hf_p-xii_exh_19500923_menti-nostrae_po.html. Acesso em 11 de março de 2011.


OBS: O endereço do blogue "Economia Católica" é: http://economiacatolicabr.blogspot.com/

Saturday, March 05, 2011

A questão social (fragmentos) - Vázquez de Mella



Seguem alguns fragmentos de magnífico discurso proferido no ano de 1903 por Juan Vázquez de Mella y Fanjul, preclaro doutrinador e Homem de ação tradicionalista espanhol, sobre a questão social.


Tende presentes, senhores, que a ordem econômica atual não é obra dos princípios católicos, não corresponde ao ideal da Economia cristã, mas antes à Economia individualista liberal triunfante na Revolução francesa, à inaugurada em parte pela Escola fisiocrática e desenvolvida pela inglesa de Smith e Ricardo e a francesa de Bastiat.
(...) Essa Economia [a Economia liberal-individualista] havia dito que o trabalho era uma mercadoria que se regulava, como as demais, pela lei da oferta e da procura, e a Economia social católica contesta: Não; o trabalho, como exercício da atividade de uma pessoa, não é uma simples força mecânica, é uma obra humana que, como todas, deve ser regulada pela lei moral e jurídica, que está acima de todas as regras econômicas.
Essa Economia havia dito que o contrato de trabalho era assunto exclusivamente privado, que só interessava aos contratantes, e a Economia católica contesta: Não; o contrato de trabalho é diretamente social por seus resultados, que podem transcender à ordem pública e social; e a hierarquia dos poderes da sociedade, e não só do Estado, que é o mais alto, mas não o único, têm em certos casos o dever de regulá-lo.
A Economia liberal havia dito que o principal problema era o da produção da riqueza e a Economia católica contesta: Não; o principal problema não consiste em produzir muito, mas sim em repartí-lo bem, e por isso a produção é um meio e a repartição equitativa um fim, e é inverter a ordem subordinar o fim ao meio, em vez do meio ao fim.
A Economia liberal dizia: Existem leis econômicas naturais, como a da oferta e da demanda, que, não intervendo o Estado para alterá-las, produzem por si mesmas a harmonia de todos os interesses. A Economia social católica contesta: Não existem leis naturais que imperem na ordem econômica a semelhança das que regem o mundo material, porque a ordem econômica, como tudo aquilo que se refere ao homem, está subordinada à moral, que não cumpre fatal, mas sim livremente, e não se podem harmonizar os interesses se antes não se harmonizarem as paixões que os impulsionam; e não é tampouco uma lei natural a oferta e procura, porque nem sequer é lei, já que é uma relação permanentemente variável.
A Economia liberal dizia: A liberdade econômica é a panaceia de todos os males, e a libve concorrência deve ser a lei suprema da ordem econômica. E a Economia social católica contesta: Não; o circo da livre concorrência, onde lutam os atletas com os anêmicos, é o combate no qual perecem os debéis aplastados pelos fortes; e para que essa contenda não seja injusta, é necessário que lutem os combatentes com armas proporcionais, e para isso é preciso que não estejam os indivíduos dispersos e desagregados, mas sim unidos e agrupados em corporações e na classe, que sejam como suas cidadelas e muralhas protetoras, porque, senão, a força de uns e o poder do Estado os aplasta.
A antiga Economia liberal dizia, referindo-se ao Estado em suas relações com a ordem econômica: Deixai fazer, deixai passar. E a Economia católica contesta: Não; essa regra não foi praticada jamais na História. Os mesmos que a proclamaram não a praticaram nunca; e é um erro frequente o crê-lo assim, em que muitos incorreram, e dentre eles sábios publicistas católicos, por não haver reparado que a antiga sociedade cristã estava organizada espontâneamente e não pelo Estado. Aquela sociedade havia estabelecido sua ordem econômica, e não a priori e conforme um plano idealista, mas sim segundo suas necessidades e condições; e quando o individualismo se encontrou com uma sociedade organizada conforme uns princípios contrários aos seus foi quando proclamou a tese de que não era lícito intervir na ordem econômica. O que era precisamente para derrubar o que existia, por meio de uma intervenção negativa, que consistia em romper um a um todos os vínculos da hierarquia de classes corporações que lenta e trabalhosamente haviam levantado as centúrias e as gerações crentes. Porque ¿que intervenção maior cabe que romper uma a uma todas as articulações do corpo social e desagregá-lo e reduzi-lo a átomos dispersos, para dar a ele, a despeito seu, a liberdade do pó a fim de que se movesse em todas as direções segundo os ventos que soprassem na cimeira do Estado?
A Economia liberal dizia... mas ¿para que continuar, senhores, se haveria que recorrer todas as suas afirmações e teorias para demonstrar que só deixaram  depois de si, ao cair sepultadas pela crítica, os escombros sociais entre os quais corre ameaçadora como um rio de ódio, que será depois de lágrimas e se sague, através de todas as sociedades modernas, a que se chama antonomásia a questão social, engendrada principalmente pela Economia liberal, que foi o pesadelo do século XIX e que é a premissa das catástrofes do século XX?