Friday, January 13, 2012

Duas liberdades, duas democracias


Duas liberdades, duas democracias*

Por Victor Emanuel Vilela Barbuy



Duas liberdades geram duas democracias.

A liberdade da ideologia liberal, abstrata e ilimitada tanto espiritual quanto materialmente e considerada como um fim em si própria e não como instrumento da Pessoa Humana, gera a democracia utópica e inorgânica em que o despotismo das multidões, o governo arbitrário do “Povo Soberano”, o império inautêntico do número, a autocracia da massa amorfa, a vil e bruta oclocracia, controlada pelas forças secretas da antitradição e da antinação, se configura na antessala da tirania, governo de um só em detrimento do Bem Comum, segundo ensina Santo Tomás de Aquino [1]; em que a representação popular não passa de mera fábula, as instituições não refletem a Tradição, a História, os costumes e a realidade das nações, mas apenas mitos brotados nas mentes doentias de arquitetos de utopias; em que os economicamente fortes exploram os economicamente fracos e os cartéis do capital especulativo e do crime organizado se constituem em verdadeiros Estados dentro do Estado e contra o Estado, roubando, matando e escravizando impunemente; em que os parlamentos e os tribunais criam “leis” contrárias à Lei Eterna, à Lei Divina do Decálogo e dos Santos Evangelhos, à Lei Natural, à Ordem Natural, à Tradição Nacional e ao Bem Comum, gerando desagregação moral e social, desordem, revolta e caos.

A liberdade da Doutrina da Tradição, liberdade para o bem, concreta e não abstrata, meio e não fim, força racional pela qual o Ente Humano desenvolve suas faculdades de acordo com a Verdade, a Justiça, a Moral e o Direito, gera a Democracia Orgânica, em que o Povo, legitimamente reunido nos Grupos Naturais, dos quais o primeiro e mais fundamental é a Família, cellula mater da Sociedade, não só é efetivamente representado como tem participação ativa nas decisões governamentais; em que impera, no campo social, a mais lídima Justiça e Harmonia e em que não são admitidas “leis” que contrariem a Lei Eterna, a Lei Divina, a Lei e a Ordem Natural, a Tradição Nacional e o Bem Comum.

Alicerçadas em quimeras, a liberdade e a democracia do liberalismo há muito ruíram. Aqueles que ainda acreditam nelas não passam de adeptos fanáticos de uma falsa religião, cujos princípios não resistiram ao embate da realidade, sobrevivendo apenas em virtude de terem sido erigidos em dogmas. Categorias por excelência do idealismo utópico, inorgânico, inautêntico e destrutivo, avesso à realidade e às instituições histórico-tradicionais que devem reger a Nação, idealismo cujos males não cansamos de denunciar, a ele opondo o idealismo orgânico, realista, autêntico, sadio e edificador, que parte da realidade, da Tradição e dos costumes pátrios [2], tal liberdade e tal democracia estão mortas há muito tempo, sendo nosso imperioso dever anunciar a todos o fato de que o Ocidente está a carregar em suas costas duas múmias e, ademais, duas múmias portadoras de terrível e implacável maldição, que tem afetado profundamente todo o tecido social.

Devemos, portanto, denunciar o caráter quimérico da liberdade do liberalismo, cujo arauto por excelência é Kant, que, além de haver separado o Direito da Moral, defendeu que a liberdade é liberdade tanto para o bem quanto para o mal, a ela opondo a liberdade da Doutrina Tradicional, cujo Mestre por excelência é Santo Tomás de Aquino e que compreende que tão somente a liberdade para o bem é verdadeira e autêntica liberdade.

Devemos denunciar, igualmente, o caráter quimérico da política do liberalismo, cujo profeta por excelência é Rousseau e cujas instituições não são para o Homem e a Sociedade reais, mas sim para entidades abstratas engendradas pela razão humana em voos de fantasia, a ela opondo a Política da Doutrina Tradicional, essencialmente realista, cujo Mestre por excelência é Santo Tomás de Aquino e que se fundamenta no fato de que, consoante preleciona Francisco Elías de Tejada, “a Tradição constitui algo mais que a medula dos povos”, sendo toda uma excelente “filosofia política”, a “filosofia do homem concreto” e das liberdades tradicionais concretas [3], em oposição à ideologia liberal do homem abstrato e das liberdades abstratas.

Devemos, ainda, denunciar o caráter quimérico da ideologia econômica do liberalismo, cujo corifeu por excelência é Adam Smith e que não se baseia na Moral Cristã Tradicional, mas sim em pretensas “leis naturais”, numa pseudomoral utilitária e hedonística e no primado do interesse particular sobre o Bem Público, a ela opondo a Economia da Doutrina Tradicional, Orgânica, Integral, a Economia Política Cristã de que nos fala Enrique Gil Robles [4], cujo Mestre por excelência é Santo Tomás de Aquino e que se subordina à Moral, da Política e do Bem Comum, que é, na expressão do Doutor Comum, “maior e mais divino que o bem privado” [5].

Devemos, numa palavra, opor à revolução inautêntica e antitradicional do liberalismo e de seus filhos, como o comunismo, o anarquismo e a denominada ideologia pós-moderna, a Revolução Tradicional e autêntica, que corresponde à “revolução tomista” propugnada por João Ameal numa de suas monumentais obras [6] e que, de acordo com o sentido mais rigoroso e próprio do termo, é a única capaz de reconduzir o Homem e a Sociedade ao seu princípio, reedificando o Homem Integral e a Sociedade autêntica, na qual vicejarão a verdadeira liberdade e a verdadeira Democracia, aquela reconhecida por Santo Tomás como legítima, ao lado da Aristocracia e da Monarquia, ou Realeza [7], que, diga-se de passagem, nada tem que ver com a monarquia liberal-parlamentar moderna, que não passa de uma liberal-democracia coroada.





[1] AQUINO, Santo Tomás de. Do governo dos príncipes ao Rei de Cipro. Livro I, Cap. I. In SANTOS, Arlindo Veiga dos (Org. e trad.). Filosofia política de Santo Tomás de Aquino. 3ª ed. melhorada. Prefácio do Prof. Dr. L. Van Acker. São Paulo: José Bushatsky, Editor, 1954, pp. 30 (trad.) e 35-36 (no latim original).

[2] Sobre os conceitos de idealismo utópico e idealismo orgânico: BARBUY, Victor Emanuel Vilela. Idealismo utópico e idealismo orgânico (Comunicação apresentada no III Simpósio de Filologia e Cultura Latino-Americana, promovido pelo PROLAM/USP e pelo Núcleo de Pesquisa “América” e realizado em São Paulo nos dias 28, 29 e 30 de novembro de 2011). Disponível em: http://www.integralismo.org.br/?cont=781&ox=137. Acesso em 27 de dezembro de 2011.

[3] ELÍAS DE TEJADA, Francisco. La lección política de Navarra. In Reconquista, Ano I, Vol. I, n. 2, São Paulo, 1950, p. 127.

[4] GIL Robles, Enrique. Tratado de Derecho Politico según los principios de la Filosofía y El Derecho Cristianos. Tomo II. 3ª ed. Nota preliminar de José María Gil Robles. Madrid: Afrodisio Aguado, S.A. Editores-Libreros, 1961, p. 270.

[5] AQUINO, Santo Tomás de. Do governo dos príncipes ao Rei de Cipro. Livro I, Cap. IX. In SANTOS, Arlindo Veiga dos (Org. e trad.). Filosofia política de Santo Tomás de Aquino, cit., pp. 98 (trad.) e 102 (no latim original).

[6] AMEAL, João. A revolução tomista. Braga: Livraria Cruz, 1952.

[7] Idem. Summa Theologica. 1ª parte da 2ª parte, q. CV, art. 1º, sol. Trad. de Alexandre Corrêa. Org. e dir. de Rovílio Costa e Luís Alberto de Boni. Porto Alegre: Escola Superior de Teologia São Lourenço de Brindes, Livraria Sulina Editora; Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul, 1980, p.1902.





*Artigo originalmente publicado na edição do boletim Ação!, da Frente Integralista Brasileira, ano I, nº 5, novembro/dezembro de 2011, p. 4. Disponível em: http://www.integralismo.org.br/?cont=-289.

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