Saturday, March 26, 2011

Os Bandeirantes

Por Victor Emanuel Vilela Barbuy


Domingos Jorge Velho (quadro de Benedito Calixto)

Os professores e autores de manuais de História do Brasil, em regra adeptos do decrépito e mofado credo marxista, ao qual o sociólogo Guerreiro Ramos se referiu alhures como “a mais influente força obscurantista da história contemporânea” [1], vêm, há já decênios, amesquinhando os construtores da Nação Brasileira, intentando inocular em nossas crianças e adolescentes o vírus, nefando como nenhum outro, do desprezo pelas tradições e pelos antepassados. Desconhecem eles a lição de Renan no sentido de que todos os séculos da História de uma Nação são folhas de um só livro, de sorte que não se engrandece e não se enobrece uma Nação caluniando aqueles que a fundaram [2], assim como desconhecem a análoga preleção de Arlindo Veiga dos Santos, quando este bravo poeta e arauto da Fé e do Império proclama que “o Presente que nega o Passado não terá futuro” [3]. Aliás, ao desconhecer tais lições, esses agentes, conscientes ou não, da antitradição e da antinação se mostram coerentes com o pensamento marxista, o que não acontece, porém, com o Sr. Aldo Rebelo, Deputado Federal pelo Partido Comunista do Brasil, que, em opúsculo sobre os Construtores do Brasil [4], faz justiça a grandes vultos da História Pátria em regra demonizados pela “historiografia” marxista, a exemplo de D. Pedro I, de José Bonifácio, do Duque de Caxias, do Almirante Tamandaré, da Princesa Isabel, do Barão do Rio Branco, de Plácido de Castro, de Felipe Camarão, de Henrique Dias, do Padre Manoel da Nóbrega, de Tibiriçá e do Bandeirante Raposo Tavares, adotando, pois, curiosamente, uma posição verdadeiramente nacionalista e mesmo tradicionalista...
Poucos vultos da História do Brasil têm sido tão atacados, achincalhados e satanizados quanto os Bandeirantes. E é justamente a eles que devemos a nossa extensão territorial, várias vezes maior do que aquela definida pelo Tratado de Tordesilhas em 1494. Daí Plínio Salgado, a quem chamamos algures “Bandeirante da Fé e do Império” e “encarnação viva do Espírito Bandeirante” [5], sendo importante ressaltar que a Doutrina por ele legada, o Integralismo, não é senão, em suas próprias palavras, a “última expressão do espírito bandeirante” [6], daí Plínio Salgado dizer que para que sejamos dignos da obra imperecível e do sacrifício dos Bandeirantes e para que nosso nome não seja amaldiçoado pelas gerações futuras, devemos fazer do gigantesco território conquistado palmo a palmo por esses Homens fortes, bravos e abnegados uma Nação unida, forte e respeitada, condenando vigorosamente os separatistas, renegadores da “herança de honra dos Bandeirantes” [7].
Os Bandeirantes de São Paulo do Campo de Piratininga foram, como salienta Oliveira Vianna, “a nobreza paulistana”, “nobreza guerreira” e “não de riqueza”, isto é, nobreza cujos títulos de nobilitação estavam em seus feitos como sertanistas e não nas riquezas por eles acumuladas, sendo “nobres porque bravos – e não porque ricos”. Esses “caudilhos do sertão”, componentes, pois de uma “aristocracia de guerreiros”, tinham, ainda na expressão do autor de Instituições políticas brasileiras, “a preferência, reservada a toda e qualquer nobreza, para os cargos da governança”, podendo se inscrever nos “livros de S. Majestade” justamente porque podiam “exibir os seus grandes feitos no sertão, as suas mais notáveis gestas de bandeirantes” [8].
Em que pese a vontade, aliás natural e legítima, dos Bandeirantes, de enriquecer e descobrir tesouros no sertão, a causa do Bandeirismo é, consoante salienta Félix Contreiras Rodrigues, “essencialmente moral”, estando “presa ao imenso sonho paulista de conquistar para seu rei (...) um imenso império, que tivesse por divisa os mais claros limites naturais – o Atlântico, o Prata, o Paraná, o Paraguai, os Andes e o Amazonas” [9]. Ademais, para compreender o nobre e elevado espírito dos Bandeirantes Paulistas, basta recordar, ainda no dizer do sociólogo gaúcho, “quantos e quantos habitantes de Piratininga, dos das suas melhores linhagens, abandonaram seus lares e seus haveres para levarem ajuda aos Nordestinos, quer contra os Holandeses, quer contra os Cariris, e os Guerens, quer contra os Negros de Palmares. (...) E a São Paulo devemos esse primeiro alinhavo da nacionalidade, posto que nunca regateou sua proteção a qualquer ponto da Colônia que precisasse dela” [10].
No mesmo sentido, João de Scantimburgo faz sublinhar, em sua obra Os paulistas, de 1982, o profundo “sentido de missão” que revestia a “formidável organização militar” em que se constituía a Bandeira, observando que os mais notáveis historiadores das Bandeiras, a exemplo de Afonso d’Escragnolle Taunay, Alfredo Ellis Junior, Paulo Prado e Cassiano Ricardo, não foram buscar na Tradição Portuguesa a origem da vocação missionária dos Bandeirantes, continuação daquela vocação missionária que moveu Portugal e caracterizou toda a ação dos Portugueses, isto é, do dever de dilatar a Fé e o Império. Sem pretender entrar na “querela teológica da predestinação”, o autor de Os paulistas e de Tratado Geral do Brasil pondera que há, em determinadas fases da História, nações predestinadas, havendo sido Portugal uma de tais nações. Parece ter sido a Nação Portuguesa, com efeito, “escolhida pela Providência para criar um grande Império, pela Contra-Reforma opor-se à Reforma, e erigir nos trópicos uma nação continental, cujo destino apenas ainda se delineia, mas que, provavelmente, será decisivo nos tempos futuros” [11].
Muitos anos antes de Scantimburgo, já havia Plínio Salgado compreendido, integralmente, o verdadeiro sentido e a verdadeira origem da missão dos Bandeirantes, prelecionando, em sua obra Nosso Brasil, de 1937, que a História da Nação Brasileira, “como continuidade da vida de uma das mais cavalheirescas nações europeias”, não tem o seu início em 1500, mas sim no momento da fundação da Nação Portuguesa e que todas as glórias de Portugal até 1822 são patrimônio comum a todos os descendentes dos heroicos cavaleiros da Reconquista e das Cruzadas, dos magnos cientistas que desenvolveram a arte da navegação, dos nautas que enfrentaram e venceram os mares ignotos, “dos descobridores do caminho das Índias, dos soldados, marujos, escritores e poetas, que foram os primeiros europeus a atingirem a costa oriental da África, os extremos da Ásia e as ilhas misteriosas do Pacífico” [12].
Em seguida, frisa o autor de Como nasceram as cidades do Brasil que “essa tradição de inteligência, de coragem, de universalismo, de sonhos grandiosos e de fé sequiosa por dilatar o Reino do Cristo, continuou no Brasil, plasmando o caráter, a consciência dos Brasileiros. O desbravamento dos nossos sertões pelos Bandeirantes, a reconquista do solo pátrio ocupado pelos Holandeses e pelos Franceses, a evangelização levada às tabas selvagens, o cruzamento das raças americana, africana e europeia, sob a inspiração da igualdade humana perante Deus, tudo isso foi continuação de uma história que principiou quando D. Afonso Henriques, em 1140, desembainhando a sua espada ensinou-nos, por todo o sempre, que devemos bater-nos com ardor e denodo por Cristo e pela Nação” [13].
No mesmo sentido, o assinalado pensador, escritor e Homem de ação patrício, em discurso proferido a 13 de junho de 1960, por ocasião da entronização da imagem de Cristo no plenário da Câmara dos Deputados, observa, em magistral discurso, que os Bandeirantes “levaram Cristo no coração, como os cruzados” e que:
“Na continuação da obra de cruzada de Portugal pelos oceanos do mundo, eles, através de nossos sertões, levaram as imagens de Cristo em seus alforjes, para, quando atacados pelas moléstias tropicais, feridos pelas serpentes e sentindo aproximar-se os limites da vida terrena, tivessem o consolo, na solitude imensa dos sertões, de beijar aquela imagem, erguendo o pensamento bem alto, aprofundando-se no sentimento da fé cristã e morrendo legando seus ossos como balizas para as novas arrancadas bandeirantes da Pátria brasileira , que agora se reinicia, neste instante histórico da fundação da nova Capital, da marcha para oeste. Ossadas que ficaram para sempre marcando a nossa capacidade de agir, de lutar, de vencer, vanguardas perdidas indicando-nos os eternos caminhos da destinação cristã da Pátria brasileira” [14].
No ano seguinte, em monumental discurso proferido na Câmara dos Deputados, em Comemoração ao Dia de Ação de Graças, Plínio Salgado agradece a Deus por nos haver feito compreender que a sua Santa Cruz deve andar, deve navegar, deve “ir de país em país, dilatando a fé e o Império – a fé em Cristo e o Império de Sua Lei -” e também por haverem nossos antepassados, os Bandeirantes, “com rudes botas, chapelões desabados e facão à cinta, dilatado este imenso Império e nos legado este vasto patrimônio territorial” [15].
Isto posto, faz-se mister assinalar que o fenômeno do Bandeirantismo, embora tenha tido, inegavelmente, seu principal centro em São Paulo, se fez presente em diversos outros pontos do País, em particular na Bahia, no Pernambuco e no Pará.
O Bandeirantismo Baiano, centrado no poderoso clã dos Garcia d’Ávila, foi magistralmente retratado no romance As minas de prata, do notável escritor e também político e jurista cearense José de Alencar, criador de uma literatura verdadeiramente nacional e nacionalista, inspirada, antes de tudo, nos costumes e nas tradições do nosso Povo, e que, por sinal, descendia de sertanistas que haviam palmilhado os sertões em nome dos Garcia d’Ávila.
As minas de prata, obra que podemos situar entre as mais importantes do autor de O guarani e de Iracema, se constitui em um dos mais significativos romances brasileiros que retratam o fenômeno do Bandeirantismo, ao lado de A muralha, de Dinah Silveira de Queiroz, e A voz do Oeste, de Plínio Salgado, estes sobre o Bandeirantismo paulista. Registre-se, aliás, que tanto Dinah quanto Plínio eram descendentes de vultos do Bandeirantismo, descendendo a primeira do Bandeirante Carlos Pedroso da Silveira, que ocupou, dentre outros, os cargos de Capitão-Mor Governador e Ouvidor de Itanhaém, de Mestre de Campo Governador de Taubaté, Pindamonhangaba e Guaratinguetá e de Provedor dos quintos reais em Taubaté, Guaratinguetá e, após a extinção destas casas de fundição, em Parati, é considerado a mais importante figura de todo o primeiro ciclo do ouro nas Gerais [16] e é, ainda, personagem de A muralha. Já o segundo descendia de Manuel Preto, o “conquistador de Guairá”, reconhecido como um dos maiores sertanistas do século XVII, havendo contribuído consideravelmente para a expansão do Império nas terras que hoje compõem o sul do Brasil [17] e que é personagem de A voz do Oeste.
Paulo Bomfim, poeta de São Paulo, de sua História e de sua Tradição, lançou, em 1960, a ideia da criação do “Dia do Bandeirante”. Afonso d’Escragnolle Taunay, Alfredo Ellis Júnior, Tito Lívio Ferreira, Guilherme de Almeida e Júlio de Mesquita Filho emprestaram “o prestígio de seus nomes ao movimento” [18]. Este último escreveu, com efeito, no jornal O Estado de São Paulo, a 16 de novembro daquele ano, um artigo intitulado Notícia Nova:
“Atendendo ao apelo de um poeta, um governador resolve criar condições para que São Paulo se debruce sobre seu passado. Por decreto do governo do Estado [do Governador Carvalho Pinto], foi instituído em São Paulo o “Dia do Bandeirante”, destinado a marcar o início da “Semana do Bandeirante” que é comemorada nos principais núcleos de bandeirantismo do Estado, tem por fim acentuar “a importância do bandeirismo na formação da nacionalidade brasileira, notadamente o sentido histórico, geográfico e humano do movimento sertanista de São Paulo (...)
“Essa pois, é uma notícia que escapa inteiramente à rotina do jornalismo cotidiano. Que nasceu do apelo de um poeta, e que se transformou em decreto pela compreensão de um chefe de Estado” [19].
Mais tarde, o Dia do Bandeirante se tornou nacional. Infelizmente, porém, pouquíssimos são os brasileiros que sabem de tal dia e menos numerosos ainda são aqueles que o celebram. Tendo em vista, pois, a relevância dos Bandeirantes para a História e para a Tradição Nacional e conscientes de que esses bravos soldados da Fé e do Império devem servir de exemplo a todos os verdadeiros patriotas e nacionalistas deste vasto Império, que existe graças especialmente a eles, proclamamos a imperiosa necessidade de celebração do Dia Nacional do Bandeirante. E defendemos, ademais, a igualmente imperiosa necessidade de vivificação do Espírito Bandeirante em todos os rincões da Pátria, ressaltando que o Espírito Bandeirante não é senão o Espírito da Nobreza de que tanto temos falado e que tanto temos oposto ao nefando Espírito Burguês ora dominante no Mundo.
Que o Espírito Bandeirante inspire o nosso Nacionalismo, Nacionalismo sadio, justo, ponderado, equilibrado e construtivo, alicerçado na Tradição e tendente ao universalismo, que não pode e não deve ser confundido com o internacionalismo burguês e apátrida do liberalismo e do marxismo, sendo, antes, o universalismo cristão tão bem praticado na Europa durante a denominada Idade Média. E que os Bandeirantes nos abençoem e caminhem conosco em nossa árdua porém gloriosa Marcha por Cristo e pela Nação, pela Fé e pelo Império!


[1] RAMOS, Guerreiro, apud DOREA, Gumercindo Rocha. Posfácio. In SALGADO, Plínio. Manifesto de Outubro de 1932 (Edição do Cinquentenário). São Paulo: Editora Voz do Oeste, 1982, p. 72.
[2] RENAN, Ernest. Souvenirs d’enfance et de jeunesse. Paris: Calmann-Lévy, Éditeurs, s/d, p. XXII.
[3] SANTOS, Arlindo Veiga dos. Ideias que marcham no silêncio. São Paulo: Pátria-Nova, 1962, p. 76.
[4] REBELO, Aldo. Construtores do Brasil. Brasília: Câmara dos Deputados, 2008.
[5] BARBUY, Victor Emanuel Vilela Barbuy. Plínio Salgado, Bandeirante da Fé e do Império. Disponível em: http://www.integralismo.org.br/?cont=781&ox=71. Acesso em 23 de março de 2011.
[6] SALGADO, Plínio. O que é o Integralismo. 4ª ed. In Idem. Obras Completas. 2ª ed. vol. 9. São Paulo: Editora das Américas, 1957, p. 42, nota.
[7] Idem. Nosso Brasil. 3ª ed. In Idem. Obras completas. 2ª ed., vol. 4. São Paulo: Editora das Américas, 1957, p. 328.
[8] VIANNA, Oliveira. Instituições políticas brasileiras. 2ª ed. rev. pelo autor. 1º vol. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio, 1955, p. 170.
[9] RODRIGUES, F. Contreiras. Traços da Economia Social e Política do Brasil Colonial. Rio de Janeiro: Ariel Editora, 1935, p. 181.
[10] Idem, p. 190.
[11] SCANTIMBURGO, João de. Os paulistas. 3ª ed. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2006, pp. 185-186.
[12] SALGADO, Plínio. Nosso Brasil, cit., pp. 289-290.
[13] Idem, pp. 290-291.
[14] Idem. Discurso por ocasião da entronização da imagem de Cristo no plenário da Câmara dos Deputados. In In Idem. Discursos parlamentares. Sel. e intr. de Gumercindo Rocha Dorea. Brasília: Câmara dos Deputados, 1982, p. 62.
[15] Discurso em comemoração do Dia de Ação de Graças. Análise do Homem, da Ciência e do Mundo Contemporâneo (30/11/1961). In Idem. Discursos parlamentares, cit., p. 49.
[16] Cf. FRANCO, Francisco de Assis Carvalho. Dicionário de bandeirantes e sertanistas do Brasil. Belo Horizonte/São Paulo: Itatiaia/EDUSP, 1989, p. 387.
[17] Idem, p. 324.
[18] BOMFIM, Paulo. Aquele menino. São Paulo: Editora Green Forest do Brasil, 2000, p. 300.
[19] MESQUITA FILHO, Júlio de, apud BOMFIM, Paulo. Aquele menino, cit., loc. cit.

Tuesday, March 22, 2011

Carta do Padre Leonel Franca a Plínio Salgado

Padre Leonel Franca


Por ocasião do lançamento do livro "Vida de Jesus", de Plínio Salgado, o Padre Leonel Franca dirige ao Autor a Seguinte Carta:

Rio de Janeiro, 28 de Outubro de 1942.


Externato e Semi-Internato Santo Inácio - Rua Jose Clemente, 226 - Rio de Janeiro.

 
Meu muito prezado Amigo Dr. Plínio Salgado. Pax Christi!

 
Acabo de receber um presente régio: a sua magnífica "Vida de Jesus", que me pus logo a ler com avidez e entusiasmo crescente. Não lhe terminei ainda a leitura, mas não quero perder a oportunidade de lhe manifestar logo, com a minha gratidão sincera, a profunda impressão que me deixaram as páginas lidas. Meu caro amigo acaba de enriquecer a literatura brasileira com seu grande livro, único talvez em seu gênero.
Neste grande momento elevado à gloria de Cristo colaboram em continua harmonia a informação exata do historiador, a piedade sincera do cristão e a inspiração sempre delicada e por vezes, sublime do artista. E a concorrência rara de todos esses dotes é sempre necessária para escrever uma Vida de Jesus destinada a ser como a sua, a jóia de uma literatura.
Creia, porém, que, para lá do enriquecimento do nosso patrimônio literário, regozijei-me ainda mais, com as ascensões interiores de sua grande alma. Uma obra desta, não se escreve sem um contato prolongado com os evangelhos, isto é, com a pessoa de Jesus, com a sua vida, a vida eterna que já começa no tempo "que te conheçam a ti mesmo, único Deus verdadeiro e a quem enviaste Jesus Cristo".
Imagino com imensa consolação todo o seu progresso interior nesta vida intensa de luz e de paz e penso com gratidão e adoração humilde nos caminhos misteriosos da providencia que tudo dispõe para o maior bem de seus eleitos.
Meu caro e saudoso Plínio, aceite com a expressão de um reconhecimento muito sincero, as minhas mais vivas felicitações.

 
Humilde servo em Cristo,


Padre Leonel Franca, S.J.



Friday, March 11, 2011

Apresentação do blogue Economia Católica


Por Victor Emanuel Vilela Barbuy




Seriamente preocupados com o avanço das nefandas ideias do liberalismo econômico nos círculos católicos brasileiros, inclusive em determinados grupos que se proclamam “tradicionalistas” ou “ultramontanos”, parecendo desconhecer que o Tradicionalismo e o Ultramontanismo são totalmente avessos a todos os matizes de liberalismo, resolvemos criar o presente blogue para difundir a verdadeira Economia Católica, Economia esta de cunho Tradicional, Histórico, Social, Moral, Ético e Orgânico, em nítida contraposição à Economia antitradicional, anti-histórica, individualista, amoral, aética e inorgânica do liberalismo, ideologia espúria corajosa, vigorosa e rigorosamente combatida, em todas as suas facetas, pelo Magistério da Santa Igreja.
Inspirados pelos ensinamentos da autêntica Doutrina Social da Igreja e dos principais vultos do pensamento católico tradicional, sustentaremos, no presente blogue, a Economia Perene do Catolicismo, transcendida pela Ética e movida por um ideal ético e compreendida como serva e não como senhora do Homem.
Temos plena consciência de que o Estado, consoante preleciona Pio XII, é, ao lado da Família, a principal coluna de sustentação da Sociedade Humana [1], assim como temos integral consciência de que o Princípio de Subsidiariedade, ao contrário do que defendem os nossos católicos adeptos do liberalismo, não proíbe o Estado de interferir na Ordem Econômica, mas, ao contrário, afirma que o Estado tem o dever de auxiliar e complementar as atividades dos indivíduos e dos Grupos Sociais Naturais, não apenas no plano econômico, mas em todos os setores da vida humana. Temos igualmente total consciência de que o domínio da Pessoa Humana sobre os bens exteriores, que esta recebeu de Deus, deve estar sempre submetido a um fim, que impõe a necessidade racional e social do bom uso de tais bens, que, consoante preleciona Santo Tomás de Aquino, não devem ser tidos como próprios, mas sim comuns, de sorte que facilmente o proprietário dê parte deles aos outros, quando estes necessitarem [2]. Temos, por fim, absoluta consciência de que a atual ordem econômica, nascida do liberalismo, é a antítese da Ordem Econômica Católica e Tradicional, que os principais arautos do liberalismo e do neoliberalismo nunca deixaram de atacar.
Adam Smith, que é o mestre por excelência do liberalismo econômico, assim como Rousseau é o mestre por excelência do liberalismo político, condenou os Grupos Sociais Naturais, particularmente as corporações, base da Economia Social Católica, como fica patente em sua obra A riqueza das nações. Mais do que isso, foi ele o responsável pela funesta separação entre a Economia e a Ética, uma vez que mesmo os fisiocratas franceses, seus precursores, reconheciam, ainda que de forma inadequada e confusa, uma certa dependência, ainda que bem remota, da Economia em face da Ética. Aliás, respondendo àqueles que sustentam que Adam Smith não separou a Economia da Ética, ressaltando que ele foi um doutrinador moral, autor de obra intitulada Teoria dos sentimentos morais, afirmamos, com o grande economista tomista italiano Gino Arias, que a doutrina moral sustentada pelo autor de A riqueza das nações é uma doutrina moral de fundo inegavelmente utilitário e individualista [3], nada tendo que ver com a Doutrina Moral Tradicional.
Outro mestre de nossos liberais, o ateu Hayek, principal expoente da denominada Escola de Viena ao lado de Von Mises, condenou abertamente a ideia de Justiça Social, elemento central da Doutrina Social da Igreja, no segundo volume de sua trilogia Direito, legislação e liberdade, intitulado A miragem da justiça social.
E Von Mises, quiçá o maior ídolo desses equivocados indivíduos que, contrariando o Evangelho, tentam adorar, a um só tempo, a Deus e a Mamon, Von Mises, que pertencia à nefanda religião daqueles cujo deus é o dinheiro, atacou virulentamente a Doutrina Social da Igreja, a que denomina, equivocadamente, “socialismo cristão”. E atacou a própria Igreja, Corpo Místico de Cristo, sustentando que “a obra civilizadora que a Igreja realizou ao curso dos séculos é obra da Igreja e não do cristianismo”, chegando ao absurdo de afirmar que a Doutrina Cristã é somente compatível com o capitalismo e a Economia de consumo e a defender a tese de que a partir do Syllabus, a Religião da Caridade teria se transformado, por seu combate ao liberalismo, em “religião do ódio do mundo, quando pareceu que este se aproximava da felicidade” [4].
Ante o exposto, exsurge a verdade, límpida, clara, cristalina e insofismável: Ninguém pode ser a um só tempo adepto do liberalismo econômico e da Doutrina Social da Igreja.
Esperando que este blogue agrade a todos os verdadeiros adeptos da Doutrina Social da Igreja e que sirva para afastar o maior número possível de católicos das fileiras do liberalismo econômico, se constituindo em uma atalaia do mais lídimo Tradicionalismo e da mais autêntica Doutrina Social da Igreja, encerramos por aqui a presente apresentação, não sem antes citarmos as magníficas palavras de Pio XII na Exortação Apostólica Mentis Nostrae, quando o Romano Pontífice, havendo sustentado que é dever do clero denunciar sem trégua a iniquidade do comunismo, se refere àqueles que se mostram tímidos na condenação dos efeitos ruinosos da ordem engendrada pelo capitalismo:
“Outros, porém, se mostram tímidos e incertos quanto ao sistema econômico conhecido pelo nome de capitalismo, do qual a Igreja não tem cessado de denunciar as graves consequências. A Igreja, de fato, apontou não somente os abusos do capital e do próprio direito de propriedade que o mesmo sistema promove e defende, mas tem igualmente ensinado que o capital e a propriedade devem ser instrumentos da produção em proveito de toda a sociedade e meios de manutenção e de defesa da liberdade e da dignidade da pessoa humana. Os erros dos dois sistemas econômicos [comunismo e capitalismo] e as ruinosas consequências que deles derivam devem a todos convencer, e especialmente aos sacerdotes, a manter-se fiéis à doutrina social da Igreja e a difundir-lhe o conhecimento e a aplicação prática. Essa doutrina é, realmente, a única que pode remediar os males denunciados e tão dolorosamente difundidos: ela une e aperfeiçoa as exigências da justiça e os deveres da caridade, promove tal ordem social que não oprima os cidadãos e não os isole num egoísmo seco, mas a todos una na harmonia das relações e nos vínculos da solidariedade fraternal” [5].


[1] PIO XII. La Elevatezza, discurso aos novos cardeais sobre a supranacionalidade da Igreja (20 de fevereiro de 1946). Disponível em: http://www.vatican.va/holy_father/pius_xii/speeches/1946/documents/hf_p-xii_spe_19460220_la-elevatezza_it.html. Acesso em 02/06/2010.
[2] AQUINAS, Sanctus Thomas. Summa Theologica. IIa, IIae, q.66, art. 2º.
[3] ARIAS, Gino. Manual de Economía Política. Buenos Aires: L. Lajouane & Cia. – Editores, 1942, pp. 58-60.
[4] MISES, Ludwig von. Le socialisme: Étude economique et sociologique. Trad. francesa de Paul Bastier, André Terrasse e François Terrasse. Paris: Éditions M.-Th. Génin, Librairie de Médicis, 1938, pp. 486 e 489.
[5] PIO XII. Mentis Nostrae. In Idem. Documentos de Pio XII. Trad. Poliglota Vaticana. São Paulo: Paulus, 1998, p. 499. Também disponível em: http://www.vatican.va/holy_father/pius_xii/apost_exhortations/documents/hf_p-xii_exh_19500923_menti-nostrae_po.html. Acesso em 11 de março de 2011.


OBS: O endereço do blogue "Economia Católica" é: http://economiacatolicabr.blogspot.com/

Saturday, March 05, 2011

A questão social (fragmentos) - Vázquez de Mella



Seguem alguns fragmentos de magnífico discurso proferido no ano de 1903 por Juan Vázquez de Mella y Fanjul, preclaro doutrinador e Homem de ação tradicionalista espanhol, sobre a questão social.


Tende presentes, senhores, que a ordem econômica atual não é obra dos princípios católicos, não corresponde ao ideal da Economia cristã, mas antes à Economia individualista liberal triunfante na Revolução francesa, à inaugurada em parte pela Escola fisiocrática e desenvolvida pela inglesa de Smith e Ricardo e a francesa de Bastiat.
(...) Essa Economia [a Economia liberal-individualista] havia dito que o trabalho era uma mercadoria que se regulava, como as demais, pela lei da oferta e da procura, e a Economia social católica contesta: Não; o trabalho, como exercício da atividade de uma pessoa, não é uma simples força mecânica, é uma obra humana que, como todas, deve ser regulada pela lei moral e jurídica, que está acima de todas as regras econômicas.
Essa Economia havia dito que o contrato de trabalho era assunto exclusivamente privado, que só interessava aos contratantes, e a Economia católica contesta: Não; o contrato de trabalho é diretamente social por seus resultados, que podem transcender à ordem pública e social; e a hierarquia dos poderes da sociedade, e não só do Estado, que é o mais alto, mas não o único, têm em certos casos o dever de regulá-lo.
A Economia liberal havia dito que o principal problema era o da produção da riqueza e a Economia católica contesta: Não; o principal problema não consiste em produzir muito, mas sim em repartí-lo bem, e por isso a produção é um meio e a repartição equitativa um fim, e é inverter a ordem subordinar o fim ao meio, em vez do meio ao fim.
A Economia liberal dizia: Existem leis econômicas naturais, como a da oferta e da demanda, que, não intervendo o Estado para alterá-las, produzem por si mesmas a harmonia de todos os interesses. A Economia social católica contesta: Não existem leis naturais que imperem na ordem econômica a semelhança das que regem o mundo material, porque a ordem econômica, como tudo aquilo que se refere ao homem, está subordinada à moral, que não cumpre fatal, mas sim livremente, e não se podem harmonizar os interesses se antes não se harmonizarem as paixões que os impulsionam; e não é tampouco uma lei natural a oferta e procura, porque nem sequer é lei, já que é uma relação permanentemente variável.
A Economia liberal dizia: A liberdade econômica é a panaceia de todos os males, e a libve concorrência deve ser a lei suprema da ordem econômica. E a Economia social católica contesta: Não; o circo da livre concorrência, onde lutam os atletas com os anêmicos, é o combate no qual perecem os debéis aplastados pelos fortes; e para que essa contenda não seja injusta, é necessário que lutem os combatentes com armas proporcionais, e para isso é preciso que não estejam os indivíduos dispersos e desagregados, mas sim unidos e agrupados em corporações e na classe, que sejam como suas cidadelas e muralhas protetoras, porque, senão, a força de uns e o poder do Estado os aplasta.
A antiga Economia liberal dizia, referindo-se ao Estado em suas relações com a ordem econômica: Deixai fazer, deixai passar. E a Economia católica contesta: Não; essa regra não foi praticada jamais na História. Os mesmos que a proclamaram não a praticaram nunca; e é um erro frequente o crê-lo assim, em que muitos incorreram, e dentre eles sábios publicistas católicos, por não haver reparado que a antiga sociedade cristã estava organizada espontâneamente e não pelo Estado. Aquela sociedade havia estabelecido sua ordem econômica, e não a priori e conforme um plano idealista, mas sim segundo suas necessidades e condições; e quando o individualismo se encontrou com uma sociedade organizada conforme uns princípios contrários aos seus foi quando proclamou a tese de que não era lícito intervir na ordem econômica. O que era precisamente para derrubar o que existia, por meio de uma intervenção negativa, que consistia em romper um a um todos os vínculos da hierarquia de classes corporações que lenta e trabalhosamente haviam levantado as centúrias e as gerações crentes. Porque ¿que intervenção maior cabe que romper uma a uma todas as articulações do corpo social e desagregá-lo e reduzi-lo a átomos dispersos, para dar a ele, a despeito seu, a liberdade do pó a fim de que se movesse em todas as direções segundo os ventos que soprassem na cimeira do Estado?
A Economia liberal dizia... mas ¿para que continuar, senhores, se haveria que recorrer todas as suas afirmações e teorias para demonstrar que só deixaram  depois de si, ao cair sepultadas pela crítica, os escombros sociais entre os quais corre ameaçadora como um rio de ódio, que será depois de lágrimas e se sague, através de todas as sociedades modernas, a que se chama antonomásia a questão social, engendrada principalmente pela Economia liberal, que foi o pesadelo do século XIX e que é a premissa das catástrofes do século XX?

Tuesday, March 01, 2011

Manifesto de 1936 - Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança

Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança (foto tirada da revista "Anauê!", !, ano I, nº 4 , Rio de Janeiro, outubro de 1935)

S.A.I. Snr. Dom Pedro Henrique de Orleans e Bragança, “o Príncipe Esperado”, fala aos Brasileiros.


Brasileiros!

Impedido por motivos de ordem particular, que deploro, de assistir como tanto quisera fazê-lo, à trasladação dos despojos mortais dos meus inesquecíveis avós, cujo maior título de glória, no mais belo sentido da palavra, foi ter servido à Nação Brasileira durante o decurso de meio século, numa estreita cooperação entre o Povo e a Coroa, é-me grato dirigir-vos esta mensagem de saudação e amizade.
Pastor do seu povo, partilhando com ele as glórias como as provações, D. Pedro II, o Magnânimo, realizou durante o seu longo reinado a obra máxima a meu ver reclamada pelo Brasil. Integrou num bloco a nacionalidade ainda dispersa, formando um todo que até hoje resiste aos mais fortes embates. Vislumbrou com clara percepção os perigos que nos ameaçavam e soube formar um feixe sólido, firmado em nossa unidade de língua e de tradições.
Assim, a república, no nascedouro, já encontrou uma nacionalidade indissoluvelmente constituída, que resistiu até hoje aos choques da politicagem dissociativa. Optando pela república, um povo opta pelas lutas internas, no dizer do pouco suspeito M. Sembat. Não cuida mais, portanto, do seu desenvolvimento de nação do ponto de vista externo. Fatalmente a mentalidade republicana é inclinada à luta demagógica e de partidos, desprezando os problemas de ordem internacional. Somente por vezes e sob a pressão de um incidente imprevisto é atraída, solicitada para o interesse nacional, que no seu íntimo receia, pois corre o risco de ser por ele dominada. O instinto de conservação dos partidos fá-la voltar logo à sua verdadeira natureza, isentando-a das realidades nacionais e alheando-a das forças mais representativas da sua unidade: o Exército e a Marinha.
O mal não é dos homens, como muito se tem dito, é do sistema que deforma o seu ângulo de visão.
Hoje, porém, o Brasil conta novamente com filhos que, vendo o perigo que nos ameaça, resolveram combater pelo ideal do Brasil uno, sem por isto prejudicar a autonomia e as diferenciações administrativas de cada região. Serão ouvidos e seguidos, pois sua causa e boa e justa; e os sofismas não poderão prevalecer contra eles.
Permita Deus que os espíritos dos grandes lidadores da integridade do Império, D. Pedro II e Caxias, animem e orientem os esforços dos Brasileiros em prol de uma pátria forte e unida pela sua mística e aspirações.
Mas isto não quer dizer que, para alcançarmos o objetivo colimado tenhamos que nos sujeitar à hipertrofia funcional do Estado, pois é essa a causa máxima da profunda depressão atual em todas as esferas de atividade, tanto social como política, econômica e financeira.
Por outro lado, o liberalismo econômico sem freios escraviza o mundo à alta finança internacional e anônima, sendo também uma das causa mais deploráveis do mal estar social.
Assim é que a tão propalada liberdade de trabalho não passa de uma utopia, que acaba resultando na sujeição do fraco pelo forte. O remédio eficiente reside no restabelecimento das corporações, reunindo patrões, empregados e operários de ofícios ou profissões, pertencentes ao mesmo ramo de produção. Assim fazendo, afastaremos a luta de classes, estéril e nociva para todos os interessados, oriunda da forma sindical operária ou patronal. O sistema corporativo elimina esses elementos de desassossego e realiza, no plano econômico, a organização racional da produção.
A história, como a vida, é um perpétuo recomeçar e uma constante inquietação, em prol de um objetivo ideal que se resume no maior bem estar possível, moral e material, da coletividade.
Ora, alcançaremos essa meta quando o povo, cansado de sofrer as desilusões dos fogos fátuos dos regimes ditos democráticos, voltar a uma fonte estável de governo, que reparta criteriosamente a ação administrativa, impondo a cada qual que pretenda a honra de “servir”, responsabilidades insofismáveis.
Mas um governo para assim agir necessita de unidade de direção e de liberdade de ação, dentro daquela unidade; requer também unidade de propósitos, condicionada por uma e outra premissa e uma perfeita adaptação dos meios ao fim, isenta de cálculos de ambição ou de proventos pessoais. Ora, nenhum regime consubstancia melhor esses requisitos de um bom governo, do que a forma monárquica, sob o aspecto que acabamos de expor.
Sem necessitarmos de muito otimismo, estamos presenciando, de alguns anos para cá, a uma evolução marcada no sentir dos povos ocidentais. Já não confiam mais nas promessas desabridas e irrealizáveis dos seus cortesãos, que, à caça do voto, não recuam ante a desordem e a anarquização dos espíritos e agem sem medir as consequências.
São as divergências intestinas, oriundas dessa neutralidade imediatista, que constituem hoje em dia a ameaça constante à nossa nacionalidade. Essa ameaça só pode ser contrabatida pela volta a um ambiente de brasilidade, sempre de atalaia contra as forças de dissociação.
Assim preste Deus ao Brasil o seu auxílio!

Pedro Henrique

Mandelieu, 11/XI/1936

(transcrito de folheto divulgado pela Ação Imperial Patrianovista)